O cinismo foi uma corrente filosófica fundada por Antístenes, um discípulo de Sócrates, mais ou menos 400 anos antes de Cristo. O mais famoso dos cínicos se chamava Diógenes de Sínope, um sujeito que ficava dentro de um tonel ou vaso funerário, e que durante o dia vagueava com uma lanterna acesa a procurar homens virtuosos.
Uma história famosa de Diógenes é a de que certo dia, quando estava tomando sol, chegou inesperadamente o todo poderoso imperador Alexandre Magno e lhe disse: “Pede-me o que quiseres” e o cínico lhe respondeu: “Desejo apenas que te afastes do meu sol e não me faças sombras.”
A resposta ilustra bem o pensamento cínico. Diógenes não desejava nada a mais do que o que tinha à sua disposição e estava feliz assim. Desejava apenas que seu sol fosse desbloqueado. Assim, o objetivo essencial dos cínicos era a conquista da virtude moral, que somente seria obtida eliminando-se da vontade todo o supérfluo, tudo aquilo que fosse exterior.
Nos tempos modernos, o termo cínico se refere àquelas pessoas desavergonhadas, impudentes, que desdenham dos escrúpulos alheios, que se mostram atrevidas ou descaradas ao seguir seus impulsos ou interesses. Segundo o jornalista, crítico e filólogo americano H.L. Mencken, o cínico moderno é o homem que quando cheira uma flor, olha ao redor procurando o caixão do defunto.
Os parágrafos acima são baseados numa crônica de Rubem Fonseca, que já postei aqui no blog há algum tempo. Retornei a ela empurrado pelo comportamento de alguns personagens da vida xapuriense, que em seus “discursos” abusam do cinismo na sua acepção moderna e se distanciam anos-luz do sentido primordial do termo, que é sinônimo de virtude e de humildade.
A empáfia de alguns sujeitos nos mostra que homens como Diógenes já não existem, e aqueles a quem procurava com sua lamparina acesa à luz do sol estão cada cada vez mais difíceis de se encontrar. No lugar deles estão os indivíduos cuja alma foi corroída pela vaidade cega e pela arrogância desmedida que não se amparam em conteúdo moral, cultural ou intelectual algum.
Talvez por essa razão vivamos na situação lastimosa de então e sem expectativas de mudança a curto prazo. Pessoas consumidas pela soberba e narcisistas desvairados, cuja grande e única arma é uma combinação de dissimulação e prepotência, não podem contribuir com o debate democrático tão necessário para que as mudanças que almejamos possam um dia se concretizar.
O jornalista Jânio de Freitas, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, no último dia 6 de agosto, disse que quando um sujeito decide se candidatar a alguma coisa ele já está acreditando ser merecedor de reconhecimento pelas qualidades que em geral não tem, mas que supõe ter, numa clara demonstração do narcisismo político que toma conta de quem se apresenta ao povo não como instrumento para a equação de problemas, mas como a própria solução.
Na pequena e pacata Xapuri, além de confirmar o que afirma o jornalista, grande parte dos candidatos estão indo mais longe. Acreditam piamente que o tal reconhecimento a que acreditam fazer por merecer já os tornou seres à altura do próprio Alexandre Magno, o todo poderoso imperador romano que oferece qualquer coisa. Precisam aprender muito com Diógenes, o cínico de Sínope que apenas desejava continuar recebendo a luz do sol.
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