quarta-feira, 31 de julho de 2013

Caminho da Escola

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São 92 ônibus para atender todo o Estado, distribuído para 13 municípios. Xapuri recebeu seis ônibus, Epitaciolândia, sete e Brasileia, oito. Os municípios que não foram contemplados já receberam veículos através de convênios com as prefeituras. A nova frota de ônibus escolares é fruto de um convênio no valor de R$ 21 milhões entre o governo do Estado e o Ministério da Educação, através do Programa Caminho da Escola.

Reportagem de Tatiana Campos, na Agência de Notícias do Acre.

Semana de combate às hepatites

Comorbidades e doenças associadas à Hepatite C merecem atenção

A infecção pelo vírus da Hepatite C (HCV) pode levar a uma série de manifestações que, além de afetarem o fígado diretamente - evoluindo para a forma crônica da doença, posteriormente fibrose, cirrose e até câncer -, podem acometer outros órgãos e sistemas, ocasionando lesões diversas. Algumas manifestações, denominadas extra-hepáticas, acontecem devido à constante estimulação da doença sobre o sistema imunológico do paciente. Articulações, rins, pele e tireoide são os órgãos e sistemas principalmente afetados, podendo apresentar diversos tipos de erupções cutâneas, insuficiência renal, distúrbios da tireoide entre outras consequências.

Alguns estudos têm demonstrado ainda uma associação da Diabetes Mellitus tipo II (não insulinodependentes) com o HCV. O mecanismo exato da ação do vírus no surgimento da Diabetes II é desconhecido, mas os portadores dessa comorbidade apresentam menor resposta ao tratamento da Hepatite C.

Nos pacientes portadores do HIV, a coinfecção pelo vírus da Hepatite C torna-se um sério problema de saúde pública, principalmente devido à rápida evolução da doença hepática e à pior resposta ao tratamento com Interferon Peguilado e Ribavirina. Nessa população HIV positivo, a prevalência de coinfecção com o vírus da Hepatite C é alta, chegando até 30% no Brasil e muitas vezes o exame anti-HCV pode aparecer não reagente, já que em função da imunodepressão causada pelo vírus HIV, o anticorpo da Hepatite C não pode ser detectado. Por isso, para esses pacientes é necessário ter maior atenção, e realizar outros testes caso haja suspeita de infecção pelo HCV.

É importante ressaltar, que pacientes com manifestações extra-hepáticas ou coinfecção pelo HIV devem ser tratados independentemente do grau de lesão no fígado.

Os cuidados com a interação medicamentosa para o tratamento da Hepatite C e das doenças associadas também devem ser observados, uma vez que é comum os efeitos colaterais do tratamento da comorbidade acelerarem as complicações da Hepatite C e vice-versa.

Saiba mais sobre a doença

Hepatite C - O que é e Diagnóstico

SOBRE HEPATITES VIRAIS

Grave problema de saúde pública no Brasil e no mundo, a hepatite é a inflamação do fígado. Pode ser causada por vírus, uso de alguns remédios, álcool e outras drogas, além de doenças autoimunes, metabólicas e genéticas.

No Brasil, as hepatites virais mais comuns são as causadas pelos vírus A, B e C. Existem ainda os vírus D e E, este último mais frequente na África e na Ásia.

Essas doenças podem ser classificadas, de acordo com as formas de transmissão, em dois grupos:

1)    Hepatites A e E - transmitidas de modo fecal-oral (ingestão de alimentos contaminados ou contato com fezes contaminadas); o mecanismo de infecção está relacionado às condições socioeconômicas, de saneamento básico e de higiene pessoal;

2)    Hepatites B, C e D - transmitidas pelo sangue, por meio de transfusão de sangue e hemoderivados, hemodiálise, procedimentos cirúrgicos e odontológicos em que não se aplicam as normas de biossegurança adequadas, da mãe para o filho durante gravidez e parto (transmissão vertical) ou pelo contato sexual. Esses tipos de hepatites ainda podem ocorrer em consequência do compartilhamento de material contaminado para uso de drogas ou de objetos de higiene pessoal, ou colocação de tatuagens e piercings.

SOBRE A HEPATITE C

De acordo com dados do Boletim Epidemiológico de Hepatites Virais, os casos confirmados de hepatite C, entre 1999 e 2009, registrados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), totalizam 60.908. Em relação à faixa etária, o diagnóstico foi mais frequente em indivíduos de 30 a 59 anos de idade. No sexo masculino, 35%, encontram-se na faixa etária de 40 a 49 anos de idade. No sexo feminino, a faixa etária de 40 a 59 anos de idade representa 50% dos casos.

Transmitida principalmente por sangue contaminado pelo vírus HCV, a hepatite C pode causar tanto infecções agudas como crônicas, ou seja, pode evoluir naturalmente para a eliminação do vírus ou, na falha desse mecanismo, tornar-se uma infecção crônica, principal determinante da ocorrência de cirrose e câncer de fígado nos indivíduos afetados.

Seus sintomas são pouco frequentes, tanto nas infecções agudas quanto nas crônicas. Porém, na fase aguda da doença, o paciente pode apresentar desde sintomas inespecíficos - como febre, mal-estar, cefaleia, dores musculares, náuseas e vômitos - até sintomas como icterícia (pele e olhos amarelados), colúria (urina muito escura) e hipo ou acolia fecal (fezes esbranquiçadas).

No exame físico, pode-se encontrar o fígado ligeiramente aumentado e doloroso. Entretanto esses sintomas só estão presentes em 30% a 40% dos casos, fazendo com que muitas vezes o diagnóstico só seja estabelecido na fase crônica da doença.

Cerca de 75% a 80% dos pacientes permanecem com a inflamação no fígado por tempo prolongado, superior a seis meses, caracterizando a doença crônica. Desses pacientes, 20% evoluem para a cirrose, passando a ter um risco de 1% a 5% ao ano de desenvolver câncer de fígado (hepatocarcinoma).

Milhões de pessoas no Brasil são portadoras do vírus da hepatite C e não sabem. Silenciosa, é uma doença com longo período de evolução. O paciente, em geral, demora cerca de 30 anos para desenvolver cirrose ou câncer de fígado. Entretanto, o curso da doença é afetado por vários fatores, especialmente pela ingestão de bebida alcoólica e pela coinfecção por outros vírus.

DIAGNÓSTICO

O anti-HCV (anticorpo produzido naturalmente pelo organismo) é o primeiro teste que deve ser feito nos pacientes para triagem de hepatite e marca o contato da pessoa com o vírus da hepatite C. Esse anticorpo demora de 4 a 6 semanas para se tornar detectável no sangue dos pacientes após o contato com o vírus, podendo persistir indefinidamente.

Outro exame que pode ser utilizado é o PCR, que mostra a presença do vírus no organismo do paciente. O PCR pode ser qualitativo (indica a presença ou não do vírus) ou quantitativo (avalia a quantidade de vírus presentes).

Desde 2011, o Ministério da Saúde ampliou a oferta de testes rápidos gratuitos para detecção da hepatite C, nos chamados CTAS (Centros de Testagem e Aconselhamento). O atendimento no CTA é inteiramente sigiloso e, se o resultado do teste for positivo, a pessoa é encaminhada para tratamento nos serviços de referência.

Para localizar o CTA mais próximo da sua residência basta acessar o link (Centro de testagem e aconselhamento) e clicar na caixa Localizar endereço na coluna à direita da página inicial.

QUEM DEVE FAZER O TESTE PARA DETECÇÃO DA HEPATITE C (grupos de risco):

pessoas que receberam transplante de órgãos ou tecidos, como córneas e pele, além de doadores de esperma, óvulos e medula      óssea;

  • pessoas que receberam transfusão de sangue ou de qualquer derivado de sangue antes de 1993;
  • doentes renais em hemodiálise;
  • pessoas que usam, ou usaram alguma vez, drogas injetáveis ou cocaína inalada;
  • indivíduos que usaram medicamentos intravenosos por meio de seringa de vidro nas décadas de 1970 e 1980;
  • portadores do vírus HIV;
  • filhos de mães contaminadas com a hepatite C, seguindo recomendação do pediatra;
  • pessoas que tenham feito tatuagens ou piercings em locais não vistoriados pela vigilância sanitária;
  • pessoas com parceiros sexuais de longo tempo infectados com hepatite C;
  • pessoas com múltiplos parceiros sexuais ou com histórico de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs);
  • pessoas com necessidade de diagnóstico diferencial de agressão ao fígado;
  • profissionais da área da saúde, após acidente biológico ou exposição percutânea ou das mucosas a sangue contaminado.
  • profissionais da área da saúde, após acidente biológico com exposição percutânea ou das mucosas a sangue contaminado.

Referências: 

HEPATOLOGIA, S. B. (2012). Imprensa / Releases / SERVIÇO: grupos de risco. Fonte: www.sbhepatologia.org.br: http://www.sbhepatologia.org.br/pdf/release1.pdf

MINISTÉRIO DA SAÚDE, (s.d.). Boletim Epidemiológico Hepatites Virais 2011. Acesso em julho de 2012. Disponível em www.aids.gov.br: http://www.aids.gov.br/publicacao/2011/boletim_epidemiologico_hepatites_virais_2011

MINISTÉRIO DA SAÚDE, (s.d.). Hepatites Virais: Desafios para o período de 2011 a 2012. Acesso em julho de 2012. Disponível em www.aids.gov.br: http://www.aids.gov.br/publicacao/hepatites-virais-desafios-para-o-periodo-de-2011-2012

MINISTÉRIO DA SAÚDE, (s.d.). Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Hepatite Viral C e Coinfecções. Acesso em julho de 2012. Disponível em www.aids.gov.br: http://www.aids.gov.br/publicacao/2011/protocolo_clinico_e_diretrizes_terapeuticas_para_hepatite_viral_c_e_coinfeccoes

HCV, O VÍRUS DA HEPATITE C

É um vírus RNA da família Flaviviridae, que só foi identificado em 1989. Em 1992, foi desenvolvido o primeiro teste para identificação do anticorpo contra o HCV (anti-HCV), proporcionando maior segurança em transfusões sanguíneas e permitindo o diagnóstico da doença. O HCV é classificado em seis principais genótipos (designados de 1 a 6). No Brasil, o genótipo 1 é predominante.

Estima-se que aproximadamente 3% da população mundial estejam infectadas pelo vírus da hepatite C (HCV), o que representa cerca de 170 milhões de indivíduos com infecção crônica e sob o risco de desenvolver as complicações da doença. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é considerado um país de endemicidade intermediária para hepatite C, sendo que de 1% a 1,5% da população é de portadores crônicos da doença.

De acordo com o Ministério Saúde, cerca de 1,5 milhão de brasileiros estão infectados com o vírus da hepatite C, porém, 50% deles desconhecem o problema. Por isso, apenas 100 mil brasileiros receberam efetivamente tratamento até hoje.

OBJETIVOS DO TRATAMENTO

Não existe vacina para hepatite C e a decisão de iniciar o tratamento deve considerar o risco de progressão da doença, a probabilidade de resposta terapêutica, os efeitos adversos do tratamento e a presença de comorbidades. Os pacientes em estágios mais avançados, com fibrose avançada e cirrose, são os que necessitam mais rapidamente de tratamento.

  • Hepatite C Aguda - O tratamento visa reduzir o risco de progressão da doença para a forma crônica. Por isso, independentemente de sintomas, é importante que se faça a detecção precoce da doença, pois quanto antes for feito o diagnóstico e iniciado o tratamento, maiores são as chances de cura (resposta virológica sustentada);
  • Hepatite C Crônica - O tratamento visa controlar a progressão da doença hepática, por meio da inibição da replicação viral, impedindo a evolução para cirrose e câncer de fígado, portanto, aumentando a expectativa de vida do paciente.

EVOLUÇÃO DO TRATAMENTO

Interferon (IFN) - Foi o primeiro medicamento introduzido no tratamento da hepatite C, ainda na década de 90. O interferon é uma proteína imunorreguladora que aumenta a capacidade do organismo de destruir células tumorais, vírus e bactérias. Ele pode ser classificado em alfa, beta e gama (ou imuno-interferon). O interferon alfa, utilizado no tratamento de Hepatite C, apresenta 14 subtipos com especificidades ligeiramente diferentes.

Ribavirina (RBV) - Ainda na década de 90, estudos clínicos demonstraram que a administração do antiviral ribavirina, associado ao interferon, por 48 semanas, levava à cura da hepatite C (resposta virologia sustentada) em 40% a 50% dos casos, números duas a três vezes maiores do que os obtidos apenas com interferon. Nascia assim a Terapia Dupla.

Inteferon Peguilado (PEG INF) - Introduzido à terapia padrão nos anos 2000, este tipo de interferon apresenta melhor tolerabilidade e maior persistência de níveis séricos adequados, permitindo melhor condição de tratamento para os pacientes portadores do genótipo 1 da Hepatite C.

Inibidores de Protease (IPs) - Desde o final de 2011, está disponível no Brasil um novo modelo de tratamento que consiste na combinação do interferon peguilado e da ribavirina com os inibidores de protease, uma nova classe de medicamentos que aumenta as chances de cura dos pacientes, podendo chegar a 80%, até mesmo aqueles que não obtiveram sucesso com a Terapia Padrão. A chegada desses antivirais de ação direta (DAAs) é a primeira inovação no tratamento da hepatite C em mais de 10 anos.

Atualmente o Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza o injetável Inteferon Peguilado alfa-2b e alfa-2ª, as cápsulas de Ribavirina e os Inibidores de protease Boceprevir e Telaprevir para o tratamento da hepatite C.

Referências:

BIO-MANGUINHOS / FIOCRUZ (s.d.). INTERFERON - alfa 2b humano recombinante - Monografia do Produto. Rio de Janeiro, Disponível em http://www.fiocruz.br/bio_eng/media/monografia_interferon.pdf; Ultimo acesso em Julho/2012.

MINISTÉRIO DA SAÚDE, (s.d.). Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Hepatite Viral C e Coinfecções. Brasília, 2012. disponível em http://www.aids.gov.br/publicacao/2011/protocolo_clinico_e_diretrizes_terapeuticas_para_hepatite_viral_c_e_coinfeccoes; Ultimo acesso em Julho/2012.

MINISTÉRIO DA SAÚDE, (s.d.). Suplemento 1 - Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Hepatite Viral C e Coinfecções - manejo do paciente infectado cronicamente pelo genótipo 1 do HCV e fibrose avançada. Brasília, 2013. Disponível em (http://www.aids.gov.br/sites/default/files/anexos/publicacao/2011/49960/suplemento_1_85095.pdf); Ultimo acesso em Junho/2013.

domingo, 28 de julho de 2013

Monólogo para loucos que mordem

*CLÁUDIO MOTTA

Não vejo nenhuma utilidade em um errante extremado, reincidente há milênios, como tu, ó poeta bestial, ficar se atormentando com aquilo de ruim que já fez. O que de melhor pode acontecer é a emenda ficar bem pior que o soneto. Tudo poderá entortar de vez.

Por isto, mesmo consciente do erro, tu não tens te arrependido, nunca. Não tens pedido desculpas, jamais. Segues sempre em frente, na marra, e bates com a cara na parede ou com os cornos na lama pútrida dos mal avaliados por si próprios. Estás ferrado, meu velho tripudiador, tal e qual a mariposa que bruxuleia noite afora até cair morta pela luz do dia que a ofusca e pelo orvalho que a faz murcharem as asas.

Já ouviste aquele que diz não se arrepender do que fez?

Minha caríssima jornalista linda  -  Isabela  -  que não pode casar ainda só depois que se formar... Cá de minha parte, tenho passado por dias bem moderados, incrivelmente sóbrios, quase castos, inocentes mesmo, puros com certeza, ingênuos até. Torna-se então difícil dar crédito a mim mesmo, mas noto que a meia idade me permite dias como esses, logo seguidos por tempos em que a barbárie da época e a estupidificação da mente leva-me aos templos do prazer que me furtam a vida abatida entre a lascívia do corpo e o embebedamento da alma.

- Não. Eu não me arrependo!  -  Assim tu o dizes, como se fosses o senhor dos anéis e das verdades plausíveis e também das injustificáveis.

Como não esqueço as barbaridades que proferes sem nenhum remorso, afirmo-te que já ouvi da tua e de outras muitas bocas tal assertiva ser dita até com muita ênfase. Tu não és o senhor do destino, o dono da providência e não estás acima do bem e do mal. Ora, tá! Quem és tu, ó meu nobre cavaleiro do apocalipse às avessas?

É pouco provável que me compreendas, mas te respondo com as palavras de Zaratustra, que desde há muito são exatamente o meu porte de armas e a minha moda de viver, viola, cavaco e bandolim:

Moro em minha própria casa

Nada imitei de ninguém

E ri de todo traste

Que não riu de si também.

De cá da serenidade rotineira que é este céu em que agora faço morada, tenho tentado passar a ti receitas preciosas que tu não copias porque não mereces decifrar. Ou não decifras porque sequer sabe copiar.

Em um momento do dia, tu te arrependes por não ter feito aquilo que não fez. Logo em seguida, vem o arrependimento que paira sobre o que por você foi feito em detrimento ou prejuízo de uma ou de muitas delas. Em realidade, caem gotas de sangue e vêm as dores do espírito quando lembras ter agido em agravo de alguém, conscientemente. 

Não roubaste, é provável. Não mataste, é certo. Não desonraste pai e mãe, de forma alguma. Todavia, olhaste para a mulher do próximo inclusive quando o próximo estava bem próximo e tu estavas com a cara rica de malte. Depois, na festa de dezoito anos, ela passou rebolando dentro de um vestido saco tendo ao lado um cara fraco e você foi tirá-la pra dançar... Ela não dançou porque tu também não te atreveste a tanto. Só onda... Simplesmente, a ninfeta irmã da aniversariante foi passando e a alma imbecil foi virando o pescoço para acompanhá-la na sua divinal cadência de ancas largas, de forma a que só saíste do transe quando a noiva tão querida te meteu uma bolsada na cara de pau que antes tu tinhas e hoje já não tens. Eu vi tudo. Dito e feito, ela te pegou pelo braço, sacudiu com alguma violência e saiu puxando, como fazem as mães com as crianças arteiras quando são flagradas em delito mínimo. Foste para a casa dela, onde fazias pousada aos finais de semana, de táxi, tendo o teu automóvel ficado na praça em frente ao clube da avenida principal. Lá chegando, foste direto para o ninho do amor. Ela sacou as roupas e pulou em cima de ti. Pegou-te pelos pulsos e disse então:

- Dá próxima vez, jogo em você um copo de cerveja na cara, dou-lhe uma bofetada e termino o noivado. – Disso eu também lembro.

Em êxtase apalermada, conseguiste dormir talvez em vista do fato de a latitude e a longitude estarem estrábicas. Tendo acordado às onze, foste em busca do corcel 2 de nome Anastácio. A noiva ficara a tomar sol. Chegaste ao meio dia. O almoço foi à tripa forra, uma vez que a quase sogra era excepcional nas artes culinárias. Mais tarde, enquanto ela dormia a sesta a sono solto, apanhaste uns paninhos de bunda, digamos assim, e voltaste para debaixo da saia de mamãe, na cadeia velha, com medo do deslize que poderia ocorrer em outros aniversários, como tornou a se repetir um ano depois, agora, já em outra companhia... Ah, moleque!

Pense bem. Até eu ficaria com medo da peia, ó anjo rotundo! Afinal, apanhar em sociedade deve ser feio inclusive aos olhos dos circundantes.

Certo é que te arrependeste muito por fazer-te acreditar por uma moça que só queria o bem a você, ó pústula!

Um dia, então, houveram por bem te arranjar um bom casamento, no dizer da tua mamãe, que fazia promessas ao padroeiro de Xapuri para que tu saísses de casa, logo, e bem casado aos trinta e lá vai pancada.

O que não deveria ser feito foi feito à luz da lua debaixo de chuva fininha sob umas árvores cintilantes. Apanhados já ao término do acasalamento, o plano de fuga falhou. Como eras barnabé federal, foste prontamente denunciado a uma matrona que mandava em meio Acre. A esta respeitável sinhádisseste que casarias em quinze dias, isto, porque ela prometera arruinar a carreira profissional que nunca foi essas coisas todas, apesar dos bons salários. O casório ocorreu na data aprazada. Houve felicidade por dois meses, ao fim dos quais veio a escapada para Belém, em férias por outros dois meses. Maridinho em fuga das responsabilidades, de lá um telefonema dizendo ser impossível alguma coisa mais séria, posto que ela tinha apenas dezesseis anos. Ah, calhorda!

Tudo se acabou e o arrependimento ainda hoje te corrói as tripas. Agiste em prejuízo de uma família muito decente.

Ô poeta do absurdo! Pior é, agora por último, você pensar em vir para o céu, apesar dos crimes tardios e das noites ao anteparo de camas soturnas em motéis de última categoria.

Em verdade, logo na chegada ao céu, já no átrio, bem próximo às cortinas de nuvem amarela, hás de te deparar com Vieira, o padre, portando um estandarte, em tua recepção, onde lerás algo parecido com o que um dia eu te disse. Lembras? Se um homem está verdadeiramente arrependido, se reconhece verdadeira e profundamente as suas culpas, nunca ninguém falará dele tão mal que ele não se julgue por muito pior.

É mesmo assim. Contraditoriamente, do lado do mundo dos prazeres mais divinais, muitos são os que se arrependem por não terem cometido os deslizes mais humanos possíveis, tão doces e tão abomináveis ao mesmo tempo.

Vive tu, então, os encantos do teu mundo eternamente inesperado, vadio, pecaminoso, enquanto eu por cá vou vivendo este marasmo e essa pasmaceira que é estar sempre em atitude relax...

Venceste. Parabéns, ó anjo vagabundo! Also sprach Zarathustra.

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*José Cláudio Mota Porfiro é um cronista desatrelado: www.claudioxapuri.blog.uol.com.br.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Francisco: o santo e o papa

João Baptista Herkenhoff

No momento em que o Papa Francisco visita o Brasil, meu espírito se volta para a lembrança de São Francisco de Assis.

Ao nos postarmos à face de Francisco de Assis, a primeira ideia que nos vem é a do santo que amou a natureza e viu os animais como irmãos. Mas além deste amor universal a todos os seres vivos, Francisco amou os seus semelhantes com a paixão do devotamento irrestrito.

Na sua tradição biográfica, registra-se que ele recebeu de Deus esta missão: “Vai, Francisco, reconstroi a minha casa.”

A casa humana tinha sido transformada numa casa de indiferença e egoísmo. Francisco recebia a missão de reconstruir a casa incendiando-a de Amor. Mais do que beijar a perna do leproso, Francisco beijou-lhe a alma. Nesse ósculo de dimensão infinita, o irmão Francisco reconstruía a casa de Deus.

A casa que tinha de ser reconstruída não era a casa de ateus ou de descrentes. Era a casa dos que se ajoelhavam, rezavam, cantavam hinos de louvor mas esqueciam que o legado de Jesus Cristo não foi feito de ritos, mas de atos.

Assumindo o nome de Francisco, o Papa que foi Bergoglio assina o compromisso de, novamente, reconstruir a casa de Deus, hoje certamente bem mais em frangalhos do que no tempo do visionário de Assis.

Não me parece relevante que Francisco seja tão somente um Papa do Terceiro Mundo, de nossa vizinha Argentina. Mas que ele seja uma voz profética do Terceiro Mundo, tão corajoso e despojado quanto seu compatriota o Prêmio Nobel da Paz Adolfo Péres Esquivel. Este testemunhou em favor de Francisco quando, após a eleição papal, pretenderam atribuir ao então Cardeal Bergoglio cumplicidade com a ditadura comandada pelo General Videla. Esquivel repudiou a infâmia levantada e afirmou, peremptoriamente, que a acusação não tem o mínimo fundamento.

Compartilho a esperança do sempre inspirado Frei Leonardo Boff no sentido de que um revolucionário silencioso e humilde assentou-se na cátedra romana. Creio que não será um Papa disposto a impor pena de silêncio à voz discordante mas, pelo contrário, propenso a ouvir e dialogar, consciente de que Roma não detém o monópolio da verdade.

E ao refletir, no meu universo interior, sobre Francisco de Assis, leio que os Alcoólicos Anônimos ganharam o Prêmio Franciscano. A láurea foi concedida em reconhecimento ao trabalho dos AA para a recuperação de vidas.

Quanto serviço essa benemérita instituição tem prestado à dignidade da pessoa humana! Quão profundo é o vínculo de Francisco com todas as manifestações de amor que possam irromper no mundo!

João Baptista Herkenhoff, escritor, é Juiz de Direito aposentado e membro emérito da Comissão Justiça e Paz da Arquidioces de Vitória.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Caravana de Cultura e Humanização

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Joseni Oliveira

Após estrear em Assis Brasil e passar por Epitaciolândia, a Feira de Economia Criativa da Caravana de Cultura e Humanização chegou a Xapuri na última segunda-feira, 22, e encerrou as atividades na noite desta terça-feira, 23.

Uma vitrine de produtos culturais. Assim é  a Feira de Economia Criativa, ação do projeto Caravana de Cultura e Humanização, que é uma realização do governo do Acre, através da Fundação de Cultura Elias Mansour – FEM - e da Diretoria de Humanização da Gestão Pública, em parceria com a prefeitura de Xapuri.

Antes da Feira Econômica Criativa que foi realizada a partir das 19:00h de terça-feira na praça São Gabriel, a Caravana realizou várias atividades com oficinas e palestras que foram ministradas na Escola Anthero Soares Bezerra. A ideia do projeto é estimular e valorizar práticas culturais, artísticas e de humanização nas comunidades. Estudantes, professores e artistas participaram das oficinas. Humanização, artes e educação patrimonial são os conteúdos abordados.

Christian Moraes, da Diretoria de Humanização, afirmou que o foco principal da caravana e da feira é a excelência no atendimento a sociedade civil.

“A caravana vem trazendo Oficinas de Teatro, de Humanização da Gestão Pública, Cine mais Cultura e Educação Patrimonial. Essa semente da humanização está sempre vinculada à cultura, e é sempre um prazer visitar as cidades do interior e conhecer a cultura de cada um, que é sempre muito rica, disse.”

O projeto existe em todas as cidades acreanas. Uma ideia que pretende estimular e valorizar práticas culturais e artísticas, abrangendo conteúdos que tratam do processo organizacional, passando pelas artes, até o patrimônio cultural.

Joseni Oliveira é repórter do Sistema Público de Comunicação do Acre.

Jornada Mundial da Juventude

Papa tem discurso afinado com o da população brasileira

Por Jouberto Heringer

Estamos no inicio da 28ª Jornada Mundial da Juventude que está ocorrendo pela segunda vez na América Latina. Em 1987, quando aconteceu na Argentina, o contexto mundial refletido era bem diferente do que nos deparamos em 2013. Pode parecer uma distância pequena de 26 anos para uma Igreja que conta sua historia por séculos, mas em um período de rápidas e profundas transformações, este tempo faz eclodir diferentes questões.

A visita do Papa Francisco ao Rio de Janeiro pode ser considerada um evento marcante pela importância do momento político, econômico e social em que o país está vivendo. Além disso, vai conseguir reunir um grande número de jovens do mundo inteiro que irão participar da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) em um país em que continua sendo a maior nação católica do mundo, mesmo com a redução no número de fiéis ao longo das últimas décadas, de acordo com o IBGE. O Papa Francisco tem um diferencial ao apresentar um discurso afinado com o da população brasileira e uma mensagem atual para a juventude com uma pregação ética de humildade.

Olhando para a Madri em 2011 alguns pontos políticos semelhantes se repetem com diferentes geradores. A crise institucional vivida pela Espanha gerada por uma oligarquia política envelhecida encontra semelhança com a crise brasileira deflagrada nas ruas pedindo uma nova postura dos políticos e política brasileira que encontram-se, provavelmente, na maior crise de representatividade entre os poderes da nova República. Se a JMJ de Madri aconteceu em um clima de insatisfação política do povo que teria na eleição de novembro o seu escoadouro, no Brasil, a eleição está ainda a um ano de seu desenrolar.

Voltando ao Brasil, ver o centro da cidade do Rio de Janeiro cheio de grupo de jovens de diversas partes do mundo, caminhando e por que não, passeando, juntos, abraçados, e alguns enamorados. O sorriso, expressão da alegria interior, vem com certeza de algo maior, que supera a distância, a língua, a cultura, e ouso dizer até a teologia cristã romana, tão dogmática quanto multifacetadamente divergente. Estes jovens estão em busca do Cristo apolítico, justo e ético.

Queria destacar algumas notas sobre o Papa que percebendo cativaram-me: a simplicidade, a negação da opulência, a postura pastoral, o discurso franco, as decisões éticas, o combate à corrupção na Igreja, sua identificação pessoal com sua missão... Sei que ele não é vicário nem o vigário, que muitos acentos teológicos fazem a Palavra adquirir tom menor, e que desejaria fosse ele mais Francisco como o São e menos Papa como o Bento.

* Jouberto Heringer é reverendo e professor, atua como capelão da Faculdade Mackenzie Rio e clérigo Presbiteriano. Pesquisador em Cultos e Filosofia da Linguagem na Pós-Modernidade, é mestrando Ciências da Religião (Mackenzie/2013) e pós-graduado em Leadership (Singapore/2004) e Urban Mission (Princeton/1985). Possui graduação em Filosofia (UERJ/1991), Letras (UFRJ/1990), e Teologia (SPS/1985).

terça-feira, 23 de julho de 2013

Lama poética descalça e nua

*JOSÉ CLÁUDIO MOTA PORFIRO

Pela rua de pedrinhas de diamante para o meu amor passar, triste traste que vês em andança, coberto de andrajos rotos e amarfanhados, não demonstra de que mal sofre, nem que o torturem com avalanches de verdades sobre a cabeça torta de pedra...

Eu te observo ao longe, sim. Hás de ainda furar e fazer sangrar, é certo, os pés sujos da caminhada sofrida. Resignado, então, seguirás sem muita cor, sem nenhuma alegria, sem nenhuma luz, mas com muitas lembranças, e ainda o retinir da crueza do sol vermelho, que te bate causticante sobre a cabeça feito o tempo que urge para aqueles segundo quem nada é exatamente urgente. Apressa-te, andarilho à toa!

Morra, ó louco desalmado! Nunca hás de te encontrar! Eu te vi fugir de alcovas ou esconder-se debaixo delas, rasgar mortalhas e chorar defuntos em risos pecaminosos, imitar o canto da sereia sonegando a verdade, viver o limbo e o céu depois do inferno. Moleque querubim morto, negro do galho torto, raiz venenosa infeliz, sexo, drogas e rock’n roll...

Melhor de tudo é que também já não podes cuspir para cima ou olhar para o alto, posto que as luzes da alegria te ofuscam e te dobram os joelhos em chagas e te comem por dentro e te turvam as vistas e te fazem delirar de tanto medo de, ao caminhar sem destino, ter que dar de cara, repentinamente  -  alma penada arrastando corrente!  -  com o apito final de um trem que parte rumo ao desconhecido de quem se perdeu por não saber se encontrar.

É assim a vida. O cheiro da última ninfeta e quimera já não está espalhado pela casa. Já nem existe perfumes, como nos anos das vidas loucas varridas entre coquetéis e baladas avassaladoras do corpo e da alma. Brindemos, então! À saúde de quem tem saúde! À falência múltipla dos órgãos de quem já os têm em pandarecos.

É exatamente assim esse existir, ao mesmo tempo tão eufórico e tão triste, de quem vai pela estrada sem roteiro, sem hora de partida ou de chegada, sem o bilhete da viagem aérea que nunca fez porque sempre foi obrigado a partir, a duras penas, a pé, pelos desvãos das estradas da vida poeirenta e pedregosa. Em verdade, tu nunca chegarás sequer a ser, meu nobre vagabundo e ermitão empoeirado.

Quanto já não se disse e se escreveu sobre tudo isso, como se todos compreendêssemos os recôncavos da vida louca e estrábica. Veja você, então, o céu vermelho do último dia, a última súbita e decadente alegria, o solado roto dos pés nus. Veja bem. Já não se crê no amor em idade alta, posto que já se vive o tempo em que a transitoriedade da vida obriga o poeta a pensar muito mais na felicidade dos outros que na sua própria carne. Enfim uma luz... Pronto... Acabou de se apagar!

Então, disse-nos o outro poeta aprendiz que a tua poesia estava cadente, cáustica, melíflua, triste, caótica, dobre e redobre de mortos, cansada, mas estava linda. Sim, está. Talvez... Nunca se sabe ao certo se se está agradando a uma mulher esquecida e ansiosa e aflita pelo seu amor, ou se se está jogando a toalha do jogo aos pés de um anjo desalmado e cruel. Afinal, como anotou o Mario de Andrade, a boa poesia só surge nos momentos de devastação íntima.

Realmente, a vida é tão transitória! Vai-se o tempo, sequenciam-se as estações do ano, as eras fluem por entre os dedos, perdem-se tantos amores pela inconsistência do destino inconsequente ou pela indignidade do humano desprezível e sádico.

Lembras as mulheres que só te fizeram bem ao cruzar os teus caminhos? E tu, ó anjo vadio! Nem percebeste que dois terços delas não queriam mais que carinho e um ombro para soluçar de amor ou em vista da dor de ser amada, peito pulsante, meio extremada, como a fada que nasceu em cima da flor.

E sequer esqueceste, alma pérfida, daquelas poucas que não te quiseram tão bem, porque delas pouco viste da alma que dizia em tom agudo e sustenido: ame-me antes que já não o possas, antes que o espírito ressequido já não consiga enxergar que o amor está em qualquer parte, ou em lugar nenhum, depois, bem depois do ocaso das horas.

Tu lembras a poesia rica e bela de Mário de Andrade, como a de Vinícius, cheia de amor pra dar?

Então, olha! Quanta beleza há nos olhos sorridentes da moça da primeira fila! Passou. Já é passado que não volta nem à luz das velas de um hotel soturno feito só para o amor. Lua luz tênue e branca novamente acendeu e outra vez se apagou. Foi-se. Já era. Tu não aproveitaste a oportunidade que te deu o amor.

Vês agora a alma de Pablo Picasso acompanhado das suas sete esposas pintadas em telas negras. Fernande, Eva, Olga, Marie-Thérèse, Dora, Françoise e Jacqueline viveram a intensidade das paixões do pintor que transpôs para o seu trabalho o fascínio pelas mulheres, exaltando sensualidade e erotismo. Protagonizou inúmeras conquistas, foi o namorado amoroso, o amante fiel e o marido impiedoso. Suas consortes passavam de deusas, quando apaixonado, a tristes duendes, no fim da relação.

E tu não querias esse magnetismo do espanhol pintor? Um dia disseste a mim. Ele exercia um encanto pessoal tão grande sobre as suas amantes que a vida deixava de ter sentido sem esse glamour. Costumava se retratar como um minotauro, um ser monstruoso, fruto de amores que vão além do entendimento, protagonista de relações violentas, eróticas e cruéis. Foi essa sexualidade selvagem que transpirou pelo desenho das suas mulheres. Na Paris do século passado, Picasso devorou pessoas e eventos com grande paixão, e transformou-as em arte... És, certamente, a reencarnação do artista de Málaga.

Estás louco tal qual o teu carinho pontiagudo, massacrante, maltratante e dilacerante, feito as asas de um pássaro bruxuleante que com as asas de setas e flechas toca e fere o céu...

Haverão depois de te atordoar as malditas lembranças dos corações dilacerados das mulheres que te perderam porque, segundo a tua débil sabedoria, nenhuma te merecia. Achas, enfim, que, se as perdeste, foi porque ainda és poeta menino e não suficientemente divino e rico de elogios e competências sensíveis de um sedutor desavisado, que não soube exercitar a arte nobre que seria mantê-las ao teu lado ou bem à tua frente, para não envergonhá-las, uma vez mais.

E a vida trágica vai passando e as últimas alegorias e adereços do teu carnaval de ilusões já te estão sufocando. Já não mais as vê. A transitoriedade da vida leva a todos no bojo da sua fúria vagarosa e avassaladora, inclusive vai transportando você, meu nobre poeta cruel e vagabundo.

Ó, anjo torto! Tu não mereces as lágrimas de ninguém e muito menos as minhas.

Sofre, poeta infeliz!

O cronista: www.claudioxapuri.blog.uol.com.br.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Isso não é só covardia. É barbárie.

Do Blog do Mário Magalhães.

O Rio se comoveu com o quebra-quebra ocorrido no Leblon na virada de 17 para 18 de julho de 2013. Balanço da baderna: depredação de orelhões, placas e 25 lojas.

O Rio não se comoveu com a morte de pelo menos dez pessoas na Maré na noite de 24 e na madrugada de 25 de junho, menos de um mês atrás.

O Rio em questão é o retratado pelo jornalismo mais influente. Danos ao patrimônio no bairro bacana, paraíso onde vivi por tantos anos, receberam muito mais atenção do Estado, dos meios de comunicação e de parcela expressiva da classe média do que a perda de vidas na favela Nova Holanda, no complexo da Maré.

É muita covardia. Contra quem? Contra os de sempre, os mais pobres.

Os crimes contra o patrimônio na zona sul foram obra de bandidos, de fascistoides, de ultra-esquerdistas, incluindo pseudo-anarquistas, de pequenos burgueses vagabundos e de alguns miseráveis desejosos de trajar roupas de grife (alguém viu um operário vandalizando?). Como queimam o filme dos protestos e beneficiam o governo estadual com o verniz de vítima, talvez haja infiltrados de origem nebulosa. Cometeram crimes, têm de ser punidos escrupulosamente, nos termos da lei.

Na Maré, o Bope invadiu a favela contra a vontade dos policiais que lá estavam. O efetivo era minúsculo, pois o grosso do batalhão estava cuidando de reprimir manifestações políticas. Resultado: uma bala provavelmente disparada por traficante de drogas matou um sargento da tropa de elite.

Em seguida, sobreveio a vendeta, com a invasão massiva. Nove moradores locais mortos e nenhum PM ferido gravemente. Confronto? Isso tem outro nome: chacina. No mínimo, dois jovens não tinham antecedentes criminais, um deles de 16 anos. A legislação penal brasileira não prevê pena de morte, para qualquer crime, ainda que seja o de assassinato.

Na Maré, o grosso do jornalismo não informou nem a identidade dos mortos, com exceção da do PM. No Leblon, os personagens tinham nome, sobrenome e lágrimas de quem perdeu alguns bens. Na favela, o pranto das mães que perderam seus rebentos quase não saiu no jornal.

A cúpula da segurança do Estado convocou uma reunião de emergência horas depois de os vândalos detonarem no Leblon. Alguém sabe de um encontro dessa natureza para tratar do morticínio na Maré?

Há mais diferenças além da essencial, entre crime contra a vida e crime contra o patrimônio. No bairro das adoráveis novelas do Manoel Carlos, aprontaram criminosos que devem responder judicialmente por si mesmos. Na Maré, atuaram agentes públicos. Se não se sabe ao certo qual foi o comportamento deles, a responsabilidade é do Estado, que deveria investigar para valer, e não encenar apurações.

As agências bancárias com vidros estilhaçados e as butiques dilapidadas costumam estar protegidas por seguros. Que seguro haveria de confortar os irmãos do pessoal morto na Maré?

Acadêmicos, jornalistas, autoridades e politiqueiros que não pronunciaram uma única sílaba sobre a Maré agora posam de valentões bradando contra a desordem no Leblon. Eles só saem em defesa dos mais ricos, os pobres que se danem. São covardes, não valentes.

Merece respeito o sofrimento de tantos antigos vizinhos meus que se assustaram com o pega pra capar. Mas a vida seguiu. Na Maré, para tantos pais, a vida seguiu sem seus filhos. Já cantou Chico Buarque, saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu _teria um quarto ou dormiria no colchão da sala o adolescente que mataram?

O farisaísmo não reconhece limites. Às vésperas do desembarque do papa, celebra-se a existência. Mas muitos corações, que nojo, abalam-se apenas com a perda de patrimônio, e não de vidas. O que diria Francisco?

O recado das últimas semanas é que, para muita gente, crime contra a vida não é nada diante de crime contra o patrimônio.

Isso não é só covardia. É barbárie.

domingo, 21 de julho de 2013

Líderes de verdade inspiram as pessoas

Por Marcos Gross

Além de gerenciar equipes, uma importante função de um líder é inspirar as pessoas. A inspiração é uma forma de estímulo que pode ser utilizada com inteligência por gerentes de qualquer organização. Jesus, Moisés e Gandhi foram mestres na comunicação junto aos seus seguidores, pois alteraram os seus estados emocionais, motivaram grupos e deram-lhes direção em momentos turbulentos por meio de palavras, imagens e tons de voz inspiradores.

O desafio dos líderes sempre foi neutralizar a apatia, a indiferença e a desmotivação de grupos e comunidades através da comunicação motivadora. Nas corporações atuais há carência de “gestores inspirados”; boa parte deles trabalha a gestão de pessoas no “piloto automático”.

A Segunda Guerra Mundial tornou conhecida a fotografia na qual o líder Winston Churchill exibe, com seus dedos, o famoso “V” de vitória. A imagem representa até hoje a coragem britânica em meio a intensos ataques aéreos alemães. A ideia era incentivar os ingleses a resistir e se manterem motivados às investidas do inimigo germânico. A fotografia, publicada nos jornais da época, tinha a missão de inspirar os liderados e virou símbolo de uma mensagem de força e resistência.

Que estímulos, em forma de mensagens, poderão ser utilizados pelos líderes da atualidade para inspirar colaboradores em momentos de crise e mudanças?

Abraão mobilizou seu povo situado na Mesopotâmia (atual Iraque) a percorrer mais de 1.000 quilômetros até Canaã (atual Israel), enfrentando desafios no deserto e uma longa caminhada em um terreno hostil. Ele conseguiu cativar seus seguidores para o longo percurso através de uma frase inspiradora: “Canaã, para onde iremos, é onde corre o leite e o mel”.

O patriarca ofereceu, em forma de metáfora (leite e mel), a mensagem de que a vida em Canaã valeria o sacrifício, apesar dos desafios a serem enfrentados no deserto. A lição transmitida por Abraão, adaptada aos dias atuais, diz que um líder deve oferecer um “norte” aos seus colaboradores. Um líder inspirado convence seu “time” de que valerá a pena os esforços para atingir a “nossa Canaã”, uma terra onde poderemos conquistar a felicidade e nossos desejos mais profundos.

Hoje, muitas pessoas que ocupam cargos de chefia se contentam em serem somente “capatazes de funcionários”. Agem mecanicamente e cobram obsessivamente as metas de produção com seus “chicotes verbais”. A comunicação desses “chefes” é fria, distante e agressiva, desanimando os funcionários. O resultado é queda na qualidade de produtos e serviços.

Em situações desafiadoras, grandes líderes sabem o que se passa “dentro” dos colaboradores e conseguem, por meio de palavras e gestos, “acender a chama” da inspiração de seus colaboradores. São mensagens cheias de “leite e mel”. Fim da mensagem.

Marcos Gross é mestre em Gestão de Comunicação e autor do livro “Dicas práticas de comunicação: boas ideias para os relacionamentos e os negócios”, da Trevisan Editora.

sábado, 20 de julho de 2013

Férias: relaxar sem perder o foco

Por Letícia Bechara

As férias escolares de julho são um respiro para os estudantes. E eles curtem o momento mesmo. Combinam com os amigos mil atividades, querem viajar, enfim, aproveitar a valer. É o momento de relaxar e se divertir, mas também de se planejar e não perder o foco, especialmente para os alunos que estão em preparação para o vestibular.

As férias podem ser uma ótima oportunidade de revisar os conteúdos, visitar as faculdades que se pretende fazer o vestibular, assistir filmes e peças que ajudem a entender contextos históricos e atualidades.

Um ponto importante nessa jornada e em que pouco se reflete é a forma mais adequada para cada um aprender e estudar. Você sabe qual é a sua? Você é uma pessoa mais auditiva, visual ou cinestésica? Como isso impactar seus estudos? Pense nas suas experiências educacionais... quais foram os momentos mais marcantes? Vídeos? Apresentações? Experiências? O que fica na sua cabeça depois da semana de provas?

De acordo com a neurociência, que tem contribuído significativamente  nesse aspecto, quanto mais entendemos sobre o funcionamento do cérebro, mais podemos potencializar seu uso. As nossas memórias são registradas através dos nossos sentidos, e quanto mais sentidos usamos, mais intenso o registro, daí a importância de utilizar o máximo de recursos disponíveis.

Confira algumas dicas para potencializar o aprendizado:

1. Abuse de gráficos, imagens e desenhos - crie mapas mentais com as ideias mais importantes sobre o assunto lido.

2. Assista vídeos sobre o assunto - no Youtube sempre tem coisas diferentes e interessantes que podem contribuir com o aprendizado.

3. Monte um grupo de amigos para debater a matéria a discussão entre colegas colabora para aprender diferentes pontos de vista.

4. Grave o assunto e produza áudios _ aproveite as ferramentas do celular para aprender e compartilhar conhecimento.

5. Utilize as redes sociais para trocar experiências.

Aproveite as férias para conhecer coisas novas, reaprender, explorar lugares diferentes.  Ao final faça uma autoavaliação, valeu a pena?

As férias podem ser um ótimo momento para criar novos hábitos.

Comece com um novo hábito e logo poderá ter uma vida diferente: leitura, atividades físicas e alimentação.

Leonardo Da Vinci dizia: “ Aprender é a única coisa que a mente nunca se cansa, nunca tem medo e nunca se arrepende”.

Letícia Bechara é pedagoga e coordenadora de vestibular da Trevisan Escola de Negócios.

sexta-feira, 19 de julho de 2013

Governo entrega Polo Moveleiro em Xapuri

Os marceneiros de Xapuri receberam nesta sexta-feira, 19, o Polo Moveleiro e a reforma do Parque Industral (Foto: Gleilson Miranda/Secom)

O governador Tião Viana e o secretário de Desenvolvimento Florestal, da Indústria, do Comércio e dos Serviços Sustentáveis (Sedens), Edvaldo Magalhães, inauguraram nesta sexta-feira, 19, em Xapuri, o Polo Moveleiro e a reforma do Parque Industrial. O investimento do governo do Estado, além de valorizar a profissão, estimula a economia florestal e a legalidade do setor, que já teve mais de 80% de seus profissionais trabalhando de forma ilegal.

Com recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no valor de R$ 1,7 milhão, foram construídos sete galpões para os marceneiros de Xapuri, medindo 15x20 metros, e reformada toda a área do Parque Industrial. A construção dos galpões faz parte do Programa de Fortalecimento do Setor Moveleiro/Marceneiro do Acre.

Em 201, durante o primeiro encontro da categoria, realizado em Rio Branco, o governador Tião Viana se comprometeu em fortalecer o setor, trazendo mais dignidade para a classe que enfrentava dificuldades, principalmente junto aos órgãos ambientais. Naquele momento o governador anunciou diversos pactos com os marceneiros, entre eles estava à construção e reforma de 10 parques industriais em todo o estado, e dentro de cada parque a construção de um Polo Moveleiro.

Com informações da Agência de Notícias do Acre.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Diretas na Justiça

João Baptista Herkenhoff

A opção por eleições diretas para a escolha dos presidentes dos tribunais (estaduais e federais) está sendo discutida em todo o país. A publicação deste artigo está emparelhada com o debate que se trava neste momento. Se aprovada a ideia, todos os juízes votariam na próxima escolha do presidente, vice-presidente e corregedor geral que comandariam a nau da Justiça do Espírito Santo, que é o Estado onde resido. Nas demais unidades federativas, o mesmo ritual democrático seria celebrado. O tema foi inspirado pela Associação dos Magistrados Brasileiros, que está desenvolvendo campanha nacional neste sentido.

É empolgante a dinâmica do tempo. Às vezes os avanços pretendidos levam decênios para que se tornem realidade.

Em primeiro de outubro de 1967 – há quase meio século, portanto – defendemos esta tese na Segunda Conferência dos Juízes de Direito do meu Estado. Os colegas da magistratura acolheram a inovação. Os anais registram este fato, que foi também noticiado pelo Diário da Justiça.

A eleição dos presidentes e demais dirigentes dos tribunais foi até agora entendida como questão “interna corporis”, ou seja, questão que deve ser discutida e decidida no interior da corporação judicial.

Contradizendo essa postura de descabido resguardo do espaço forense, agiganta-se, na opinião pública, a consciência de que a Justiça é um direito, e não um favor. A leitura da seção de cartas dos leitores, o mais democrático espaço dos jornais, revela ao observador atento esse clamor.

Nesse contexto histórico, é inaceitável, tanto manter panelinhas eleitorais para escolher os dirigentes da Justiça, quanto erguer muros que vedam o acesso do povo ao território judicante. Não se concebe, por exemplo, que continuem sendo realizadas sessões secretas nas cortes de Justiça, salvo para salvaguardar a intimidade pessoal e familiar.

A ditadura das cúpulas, ao que parece, está prestes a ruir.

No Congresso Nacional duas emendas estão pretendendo instituir eleição direta nos tribunais: PEC 15/2012, no Senado, subscrita por Vital do Rêgo; PEC 187/2012, na Câmara dos Deputados, proposta por Wellington Fagundes.

Essa mudança de padrões é altamente positiva. Os ventos que estão soprando na direção de uma faxina geral na vida pública brasileira, estão soprando também no sentido de democratizar a Justiça, desnudar a deusa Têmis que, de deusa, só tem o nome. Aliás por qual motivo a Justiça deve ser ser remetida para a secreta jurisdição da Mitologia? Não prefere o povo uma Justiça humana, acessível, dialogante, de olhos abertos para vivenciar as dores das partes, juízes e juízas com as vestes dos mortais e não escondidos atrás de solenes togas?

João Baptista Herkenhoff, magistrado aposentado, é Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo, palestrante Brasil afora e escritor.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Educação que liberta

João Baptista Herkenhoff

Dois modelos de educação podem ser concebidos.

Um que se opõe a todas as mudanças estruturais porque defende a imobilidade social. “Que fique tudo como dantes no quartel de Abrantes”, como se dizia antigamente.

Outro que pretende desnudar a realidade. Denuncia a injustiça do sistema. Nega a ideia de que alguns nascem para dominar e outros para serem dominados, segundo o dito popular: “Quem nasce para boi nunca chega a ferrão.” Discorda também de uma mudança de papéis entre opressores e oprimidos, conforme retratado com sutileza pelos versos de João Mulato e Douradinho: “Na boiada já fui boi, o carreiro me bateu, o carreiro virou boi, o ferrão agora é meu”. O mundo pretendido pela educação libertadora é um mundo de fraternidade, sem espada e sem ferrão, sem coronéis que ordenam e boiada que obedece.

O projeto final da educação libertadora é contribuir para que as pessoas sejam agentes de transformação do mundo, inserindo-se na História.

Não foi por mero acaso que Paulo Freire foi preso pela Ditadura de 1964, nem foi sem motivo que o emérito educador foi obrigado a exilar-se durante aquele sombrio tempo de Brasil.

Paulo Freire afirma que a educação libertadora busca desenvolver a consciência crítica de que já são portadores os educandos. Parte da convicção de que há uma riqueza de ideias, de dons e de carismas no cotidiano dos interlocutores.

1964 quis decretar a verdade, a democracia, o patriotismo: “Brasil, ame-o ou deixe-o.” Se você não concorda com o modelo de Brasil imposto pelas armas, seu destino é pegar o avião e partir, ou fugir a pé pelas fronteiras. Sem dúvida os ideólogos de 1964 leram Paulo Freire e perceberam que a proposta educacional de Freire não se coadunava com o modelo autoritário.

Fala-se agora em estabelecer como norma constitucional a destinação de dez por cento do PIB para a educação pública. Os jovens que marcham nas ruas aprovam esta tese, que foi erguida nas bandeiras de reivindicações. Aprovo com veemência a proposta. Determinar que um décimo do produto interno bruto seja endereçado à educação pública é uma grande vitória. Isto vai trazer como consequencia a construção de novas escolas, a reforma e a ampliação das existentes, a contratação de mais professores e o aperfeiçoamento dos que já estão no quadro, a melhoria dos salários dos mestres, que hoje ganham muito pouco.

Mas voltemos a Paulo Freire. Que os dez por cento do PIB, o incremento das verbas e tudo o mais que se pede, neste momento da vida brasileira, comungue com os anseios de uma educação libertadora. Dez por cento do PIB para um tipo de escola que edifique Justiça, Liberdade, Solidariedade.

João Baptista Herkenhoff, Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo e palestrante pelo Brasil afora, é membro emérito da Comissão “Justiça e Paz” da Arquidiocese. Acaba de lançar ABC da Cidadania, livro publicado pela Prefeitura de Vitória. Distribuição gratuita.

terça-feira, 16 de julho de 2013

O trânsito e o homem da caverna

Por Jacqueline da Silva Souza e Breno Rosostolato*

O trânsito nas grandes metrópoles tem ficado cada vez mais insuportável. Coisas absurdas acontecem, mas principalmente falta de paciência, desespero, desrespeito e insanidade, que trazem atitudes violentas e cruéis, modificando o quadro de cidadania da população.

Se reportarmos à época das cavernas, vamos verificar todos esses itens, mas com uma diferença, hoje nos consideramos “civilizados”. Será? Basta uma fechada ou alguém nos xingar e aí, aparece quem? – O homem das cavernas interior – só nos falta o tacape.

Quem nunca ouviu uma história de alguém que foi alvo da ira de outro motorista por causa de uma simples buzina. Xingamentos, gestos obscenos, perseguições, fechadas... provocando pânico. Hoje, basta alguém dizer um impropério que leva “chumbo”. Sem contar que podem arrancar o seu braço, jogá-lo no rio e ficar por isso mesmo. Também se sabe que que é proibido ingerir bebidas alcoólicas e dirigir, porém quantos respeitam isso?

Há uma história bem interessante da Disney, um episódio do Pateta, que é um ser pacato, respeitável, bom cidadão, enquanto pedestre; no entanto, ao entrar em seu carro e colocar suas mãos sobre o volante, transforma-se num “monstrengo”, - um verdadeiro homem das cavernas -, não respeita os pedestres, nem sinal, buzina o tempo todo... Em suma, parece ter sido tomado por uma possessão. As autoescolas têm mostrado no primeiro dia de aula, àqueles que querem ser motoristas, esse episódio, o que para muitos é engraçado, contudo serve de reflexão.

Ultimamente, vemos esse tipo de coisa acontecendo. Na verdade, há sim uma transformação no ser humano, diria na maioria. Não obstante, verifica-se a mudança de personalidade de pessoas tranquilas, pacíficas, que ao entrarem em seus carros se descontrolam, decorrência a grande sensação de “poder”. A ideia de controle e de controlar é fascinante, muitos só têm essa sensação em seus automóveis. A pergunta é: há uma mudança de personalidade ou a demonstração da “real” personalidade de cada um?

Brigar no trânsito é coisa do homem das cavernas porque é um comportamento típico do troglodita, irracional e inconsequente, que na rua expressa toda a sua agressividade e revela sua alienação pessoal. Gritam e esbravejam como se fossem os donos da rua, passam a toda velocidade com seus carros milionários e denunciam a pobreza de seus condutores. O homem da caverna faz estardalhaço quando descobre o fogo, para que sua utilização leve à evolução, mas consegue distorcer as grandes descobertas em armas, aparelhos de destruição em massa. O carro que foi uma invenção com as melhores das intenções, para facilitar o dia a dia das pessoas, é renegado a um instrumento de status, genocídio e de insanidade. Insano mesmo são as mentes vazias, ou se preferirem, doentias, de indivíduos que têm verdadeiros comportamentos criminosos no trânsito e que assassinam muitas pessoas por ano nas ruas e estradas deste país.

O trânsito não é o responsável por esse tormento todo, e sim a falta de  princípios básicos como gentileza, educação e altruísmo. Sem os quais a barbárie vem à tona.

Se queremos um trânsito pacífico temos, à princípio, de nos pacificarmos enquanto cidadãos e pedestres.

Jacqueline da Silva Souza e Breno Rosostolato são professores da Faculdade Santa Marcelina – FASM.

segunda-feira, 15 de julho de 2013

Sorver a aposentadoria

João Baptista Herkenhoff

Algumas pessoas celebram a aposentadoria. Outras a recebem com um certo sofrimento. De minha parte tive um sentimento de vazio quando me aposentei.

Juiz aposentado, professor aposentado? Isto não é profissão. A condição de aposentado não desmerece ninguém. Contudo não define uma profissão.

Certo dia veio a inspiração e eu me autodefini: sou um Professor itinerante. E é isso que tenho feito. Ministro seminários e profiro palestras Brasil afora.

Se o aposentado sentir-se feliz, sorvendo simplesmente a aposentadoria, essa atitude não merece qualquer reparo. Ele fez jus ao que se chama ócio com dignidade (otium cum dignitate).

O pedagogo tcheco Comenius ensina:

“No ócio, paramos para pensar. Paramos externamente para correr no labirinto do autoconhecimento. Não se trata de perder o tempo, mas de penetrar no tempo para mergulhar no essencial.”

Se quem se aposentou deve desfrutar da aposentadoria serenamente, numa situação inversa a aposentadoria não tem de marcar, obrigatoriamente, um encerramento de atividades.

O aposentado tem experiência e pode transmitir experiência, o que resulta num benefício para a sociedade.

Triste é constatar que, em algumas situações, a aposentadoria é insuficiente para os gastos da pessoa e de sua família obrigando o aposentado a trabalhar para complementar o parco benefício que lhe é pago. Nestas hipóteses, estamos diante de um grande desrespeito à dignidade da pessoa humana.

Se alguma diferença devesse ser estabelecida entre ativos e inativos seria para aquinhoar com favorecimento os inativos, uma vez que a idade provecta cria gastos com saúde que normalmente não alcançam os servidores mais jovens.

No meu caso não continuei trabalhando para suplementar renda, mas sim para atender um apelo existencial.

Gosto de viajar, alegra-me conhecer lugares e pessoas, minha mulher também gosta e aí vamos nós desbravando o Brasil.

João Baptista Herkenhoff, 77 anos, Juiz de Direito aposentado, membro emérito da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de Vitória, é Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo. Acaba de publicar Encontro do Direito com a Poesia – crônicas e escritos leves (Editora GZ, Rio de Janeiro).

domingo, 14 de julho de 2013

E o Instagram “facebookizou” pra valer

Por Marcos Hiller

Nos primeiros dias de vida, o Instagram era apenas quatro funcionários, incluindo seus dois co-fundadores, e que trabalhavam amontoados nos primeiros escritórios do Twitter no bairro de South Park de San Francisco. E o Instagram, mais uma start-up da California e que não tem receita, fez brilhar os olhos de Mark Zuckerberg, que desembolsou um bilhão de dólares no ano passado e está debruçado em saber como capitalizar em cima dessa fascinante rede social de fotos.

Assim como o Google há alguns anos, comprou o YouTube, e o transformou no segundo maior site de buscas do mundo. Por trás da aquisição do Instagram percebe-se uma visível intenção do Facebook em se tornar ainda mais forte nos dispositivos móveis e deixar promissores aplicativos longe das garras do Google.

O Instagram é uma criação concebida puramente para o universo mobile. Quem usa o Instagram entende o magnetismo que essa rede social gera. O conceito é simples e genial ao mesmo tempo, pois faz com que pessoas se comuniquem por meio de imagens. A psicologia cogninitiva talvez nos ajude a entender o fascínio por esse rede social, pois ela prega que seres humanos gostam mais de imagens do que de textos. Por esse motivo que praticamente todas as marcas do mundo sempre adotam um símbolo ou um mascote para acentuar sua aproximação aos consumidores. O conceito é simples: o Instagram é fundamentalmente uma rede social concebida em torno da fotografia e disponibilizado apenas para uso em celulares (apenas para iPhone da Apple, e agora já disponível também para o “patinho nada feio” Android, o sistema operacional da Google), onde as pessoas adicionam belíssimos efeitos as suas fotos produzidas com a câmera do celular e compartilham com os amigos. O Instagram já tem dezenas de concorrentes, mas nenhum outro aplicativo teve uma ascensão tão rápida.

No entanto, o que alguns fãs do Instagram mais temiam aconteceu. Semanas atrás, ao inserir a possibilidade de se postar vídeos de quinze segundos, o Instagram começa a perder a sua originalidade e suas peculiaridades. Assim como falavam que o Facebook “orkutizou” depois que classes mais emergentes descobriram o site azul de rede social, evidenciamos que o Instagram inicia lentamente um processo de “Facebookização”.

Novas características são incorporadas a cada mês. Essa última mudança então foi muito significativa. Você está lá descendo com o dedo polegar a sua timeline do Instagram e olhando suas fotos, comentando, curtindo e, de repente, um vídeo começa a ser executado. Eu achei esquisito e até me assustei algumas vezes. Parecia que as fotos ganharam vida. Muito em breve podemos esperar games no Instagram? Ou a possibilidade de se cutucar o outro? Só o tempo nos dirá. Mas nada disso me supreenderia. O que se espera é um processo de moneitização do aplicativo. Afinal, hoje ele não gera receita. E assim como fez no Facebook no ano passado, começando a cobrar para que posts ganhem alcance maior (hoje mais de 1 milhão de clientes injetam dinheiro no site de Mark Zuckerberg), é muito previsível que esse movimento neoliberal aconteça também no nosso saudoso Instagram. Aproveite enquanto ele (ainda) é gratis!

Marcos Hiller é coordenador do MBA Marketing, Consumo e Mídia Online da Trevisan Escola de Negócios e autor do livro Branding: A Arte de Construir Marcas, da Trevisan Editora.

sábado, 13 de julho de 2013

Cá co’s seus botões já desabotoados...

*JOSÉ CLÁUDIO MOTA PORFIRO

Conversar com a minha Penélope Despudorada é sempre uma forma de rir da vida que é, ao mesmo tempo, tão transitória e tão cheia de surpresas e esquisitices provocadas exatamente pelos humanos que, como a minha heroína, chutam o balde, botam o pai na forca, escorregam na maionese, comem o diabo que o pão amassou e dizem apenas o que lhes dá na telha, principalmente, até a respeito daquilo sobre o que não entendem ou nunca ouviram falar.

Então, para dar alguma legitimidade a este texto amarfanhado, recorro às Escrituras Sagradas e vos afirmo que o que caracteriza um mau caráter é o hábito da mentira, da falta de respeito para com o próximo, da falta de amor, enfim, do trambique e da armação. Podemos dizer que o caráter mau está relacionado à prática das obras da carne. (Gálatas 5. 16 a 21) E tudo isto é a cara da Penélope, sem querer julgá-la, e já julgando, é claro.

Para a Penélope, meter-se na vida alheia ainda é esporte nacional, principalmente, depois que, ainda nos anos sessenta, uns radialistas inspiradíssimos  -  para não ser muito corrosivo  -  criaram aqueles programas nos quais as pessoas eram chamadas a dar opiniões sobre um casal que se separou em vista dos deslizes de um dos pares, ou sobre a normalista linda de dezesseis primaveras que arranjou uma barriga e nem desconfia de quem é o pai fujão... Ou sobre aquela matrona viúva e rica que pega e paga um rapazola pobre dos nossos subúrbios sociais.

A partir desse momento da tragicomédia nacional, todos perceberam que, definitivamente, têm tudo a ver com a vida daquela filha do vizinho que se acachapou com uma morena trigueira machuda e agora quer casar e adotar um bebê... E dará certo, sim, porque as duas são pessoas de ótima índole e têm objetivos bem definidos... Ora! O que é que tem? Cada qual no seu quadrado, ou até no seu redondo, sem duplo sentido.

Em verdade vos digo que a Penélope saiu da minha vida ainda nos anos oitenta, mesmo sem nunca ter sido exatamente minha amante. Tínhamos uma amizade colorida e dividíamos alcovas a cada período em motéis fétidos da periferia de Belém, onde eu tinha alguns parentes, a vida era folgada e a Vasp dava descontos fantásticos, tanto que faliu.

Aí, ela viajou para o Rio e lá encontrou um carinha, surfistinha, dragão tatuado no braço, calção corpo aberto no espaço, coração de eterno flerte, e por aí vai...

Como não poderia ser ao contrário, foi para a cama com o Mauricinho no primeiro encontro, fez barba, cabelo e bigode, deu-lhe uma tesoura de pernas e, dois meses depois, grávida de um paraense baixinho, já se instalara em Ipanema num apê de classe média alta que era dividido, antes, pela mãe viúva de um militar do AI5 e pelo rapazola traído e jamais sabido.

Um dia, então, recebi ligação telefônica do Rio. Alguém dissera que eu havia ficado bem de vida como proprietário de um desses estabelecimentos que vendem sexo a preço módico e fiado a não perder de vista, no cartão, é lógico.

Tudo mentira. Golpe sujo. Eu sempre fui barnabé federal e nunca dono de motel ou puteiro. Ela foi quem inventou a papagaiada querendo viver alguma emoção tardia nos meus braços de Aquiles, enquanto o Mauricinho ficaria surfando no Arpoador.

Mesmo assim, veio bater em Rio Branco do Acre, dizendo ter dado recesso de um mês ao casamento desgastado, segundo a própria. Doida, doida. Deixou o filho de três anos com a sogra, coitado. Arranjara ares de rica. Descolara em meio ao jet set carioca o seu próprio espelho no qual se mirava da forma como bem entendia, nua ou seminua, na cama ou na rua, com umas bermudinhas que davam tesão em cego, umas camisetas mínimas prontas para serem furadas por mamilos quase pontiagudos. À noite, então, na seresta do Vasco, estes mesmos seios túrgidos que me embebedaram chamavam ainda mais a atenção da raça miúda, por estarem embalados ou apertados em sutiã meia taça quase se derramando... Uma loucura!

- Minha caríssima, dispendiosíssima, gAstosíssima Penélope Despudorada, o que dirá a tua sogra no dia em que souber que o netinho tão amado e tão paparicado não é filho do Mauricinho, mas do paraense capa de chupeta? Ela quererá ainda a criança ou expulsará mãe e filho dos domínios ainda custeados pelo soldo do general morto?  -  Foi a minha pergunta ardilosa feita para uma mulher mais capciosa ainda.

Ao que ela respondeu:

- Em bom paraenssês, meu querido, o risco que corre o pau corre o machado. O Acre inteiro sabe disso. Você espalhou. Mas a velha lá no Rio não sabe, a fofoca não terá fundo de verdade, porque não há como provar nada e, se ela me expulsar, a justiça me assegurará todos os direitos posto que direi que ela amalucou e que há uma certidão de casamento e um registro de nascimento... Morou morais, se não morou não mora mais!

Foi aí que entendi, enquanto quase filósofo imaturo e meio maluco, que os princípios que regem o nosso caráter são trazidos de casa, da criação, dos pais. Por um lado, usando o jargão já apodrecido pelo uso, a sociedade corrompe mesmo. Depois, é como na canção antiga, segundo a qual pau que nasce torto não tem jeito morre torto, e pronto.

Já bem moderna, depois de ter sido moderninha, nos anos setenta, e modernosa nos oitenta, gravou uma fita cassete e me enviou um palavreado meio subtil, gravado, talvez, em meio à baforadas de basilares à base de marijuana.

- Soube que você agora é professor de Filosofia... Legal, né? Sucesso! Mas preste bem atenção a uma assertiva para a sua análise: o que você faria hoje se soubesse que morreria daqui a seis meses?... Pois bem. Fiz essa pergunta ontem a mim mesmo... É como aquela: e se o mundo acabasse amanhã?...

O que se seguiu foi um ato de contrição do tipo eu não presto nem nunca prestei. Sempre te vi e nunca te amei. Eu ouviria as piores notícias da tua boca metálica sorridente.

- Ora, Cláudio. Em seis meses, talvez eu desapareça. Estou me destruindo e não é com o álcool. Daqui pra lá, eu tenho ainda o que fazer. São muitos os planos. Devo arrancar o dinheiro da velha, dona Dirce, de oitenta e quatro anos. Estou encorajando o Mauricinho. Flavinho, o nosso filho e amuleto, está para se casar com a filha de um magnata residente na Delfim Moreira, Leblon, depois de colocado em prática plano bem elaborado por mim, é claro. Depois, vou dar uma volta no marido e voarei para Cancún, a fim de cumprir o resto da sina à base de champanhe, caviar e substâncias cruéis...

Senhora dona do baile, minha pequena Eva. É certo que tantos sinos já não dobram, assim como a minha poesia já não escorre com tanta fluidez. Todavia, se perguntarem o que você fará se souber que deve morrer em seis meses, as suas respostas a esta pergunta delinearão exatamente o seu caráter enquanto ser humano e participativo, ou não.

Com muito amor, do eternamente poeta ensandecido seu.

sexta-feira, 12 de julho de 2013

1º GP Artmóveis de Ciclismo

A Federação Acreana de Ciclismo (FAC), em parceria com a Confederação Brasileira de Ciclismo (CBC), realiza neste fim de semana, em Xapuri, o 1º GP Artmóveis de Ciclismo, MTB XC e Wheeling, com a participação de mais de 60 atletas de várias localidades. O evento é patrocinado pela loja Artmóveis, Prefeitura de Xapuri, Supermercado União e Governo do Estado do Acre.

Na estrada dos tijolos amarelos

Eduardo de Souza

Numa terra mui distante, habitada por sofridos aldeões, dizer o óbvio era muito arriscado. Lá, o chefe da aldeia, tinha hábitos e procedimentos insalutares, que eram comentados por todos os moradores da povoação, indistintamente, mas que não podiam ser repetidos nos painéis de informação da aldeia.

A regência desse chefe era caótica e causava prejuízos aos aldeões. Entretanto, um dos aldeões, redator de um dos painéis, ao tentar repetir comentários gerais e óbvios, foi multado em vários "dinheiros" pela sua escrita.

Não li essa história na terra de Oz, portanto não posso aconselhar o redator, a seguir pela estrada dos tijolos amarelos. Ela o levaria a encontrar o grande mágico de Oz, que num piscar de olhos diria: “A interpretação de prejuízo ao repetir o óbvio, é baseada numa linha tão tênue, que os aldeões a discutiriam por anos, sem chegar a uma conclusão... óbvia!"

Nesse caso, melhor não irmos para Pasárgada com o Manuel Bandeira. Porque não vamos todos para a terra do Mágico de Oz? A Judy Garland com seu Totó, o homem de lata, o espantalho e o leão, vão gostar, pode crer.

Da estrada dos tijolos amarelos para Xapuri, SAUDAÇÕES!

◙ Meu caro amigo Edu, você agora me fez lembrar de um poema de Amanda Maia, diretora teatral e estudante da Universidade Federal da Bahia, que nos remete a um lugar que não temos, mas que não desistimos de buscá-lo, sem temores e sem pressa:

"Até chegar àquele moinho,

Processador de pensamentos,

Lá no reino do nunca,

Onde o amor toca o tempo.

Onde as palavras são danças,

Onde o pequeno ser é guerreiro,

Onde os medos não entram.

Lá a Coragem é rainha,

Coroada pelo rei Coração,

Lá a morte não passa de um barco,

Lá, o que é solidão?

Lá não importa o que sei,

Ou o que fui, ou o que serei,

Lá o juiz é o perdão.

Lá o que sinto é o que farei,

Sem olhar pra trás, sem nem respirar,

Direi que amo você, direi, direi e direi,

E tudo será seu sorriso, tudo será seu olhar,

E então, meus sonhos realizarei,

E então, já poderei acordar".

Um grande abraço!

Postagem publidada originalmente no dia 24 de outubro de 2008.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Nunca é tarde para ler romances de amor

Romar Belling

Poucas paisagens talvez sejam tão impenetráveis à imaginação humana quanto a da Amazônia. Não bastasse o gigantismo natural da floresta, com seus segredos e seu pouco caso em relação a tudo o que o homem queira chamar de dominado, há a questão óbvia do difícil acesso. E por difícil acesso compreenda-se a própria tentativa de nomear, em língua padrão, o que nem sempre é nomeável, remetendo, de algum modo, ao instante fundador, quando navegantes precisavam encontrar parâmetro a fim de explicar ao destinatário (no assim dito mundo civilizado) o que, afinal, havia sido visto em terras estranhas.

Com a Amazônia ainda é assim. Por mais que o ser humano, em sua tentativa de aproximação, tenha avançado pelas bordas da floresta, afugentando paisagens e habitantes, ela permanece incógnita. E se para botânicos, aventureiros, viajantes, especialistas de todas as áreas, descrever ou entender esse colosso verde tem sido desafio dos mais hercúleos, não seria tarefa menor na literatura.

Até para a imaginação algumas coisas têm limites, e isso depois de o homem ter zanzado pelo universo nas asas da ficção científica. A Amazônia (como os confins dos oceanos) ainda apavora. Poucos escritores, mesmo dentre aqueles que têm a floresta no sangue, sentiram-SE encorajados a tomá-la como tema. O amazonense Márcio Souza está entre eles. Fala da Amazônia para um Brasil que, em vertigem, permanece um tanto distante daquele que constitui seu maior patrimônio natural.

Mas é conveniente render-se a outro autor, estrangeiro, a fim de embeber-se na magia amazônica. A sugestão, nesse caso, é o chileno Luis Sepúlveda (foto). A via de contato? Nada menos que uma pequena novela, de leitura rápida, e que convidará a várias (sempre enriquecedoras) releituras. Um Velho Que Lia Romances de Amor (Ática, 94 p.) começa como se imagina que deva principiar uma jornada Amazônia adentro: tateando, com respeito, pincelando a alma com a imponência da selva do lado equatoriano. E não poderia ser mais apropriado o ponto de partida: o vilarejo de El Idilio.

Uma citação real do livro é o seringueiro Chico Mendes, de quem Sepúlveda foi amigo. Como lembra na apresentação, em dezembro de 1988, na mesma época em que a novela estava sendo lida pelo Júri no Prêmio Tigre Juan, em Oviedo, na Espanha (e que afinal recebeu), o ambientalista era assassinado em Xapuri, no Acre. A circunstância fez com que o autor dedicasse a obra a Chico Mendes. No campo político, o escritor foi (e ainda é) militante: integrava, por exemplo, a guarda pessoal do presidente Salvador Allende quando da deposição deste, em setembro de 1973. Mais do que dono de privilegiada imaginação, Sepúlveda detém outro mérito nesses tempos atuais: em se tratando de história, como se diz, ele é testemunha. Esteve lá.

O AMOR É UMA LEITURA O universo no qual mergulham os personagens de Um Velho que Lia Romances de Amor, liderados pelo soturno Antonio José Bolívar Proaño (o velho), não admite arrogâncias, requer não menos que entrega absoluta. Isso significa: familiaridade com a solidão, com a desesperança, com o desencanto em relação à devastação ambiental na maior riqueza natural do planeta e em relação à aridez do coração humano.

Ao ingressar na floresta, como lembra Sepúlveda, nas malhas de seu fazer literário, é preciso começar tudo de novo. O contato com o mundo exterior fará cada vez menos sentido, perderá completamente as bases. A sutileza da obra está justamente no fato de que a transição, a mediação, o último refúgio de integridade entre esses dois mundos se dará pela via da leitura.

É lá nos confins da Amazônia que um velho, para preservar seu afeto e sua identidade, começa simplesmente a ler. E lendo, preenche lacunas (de amor, de ternura, de esperança) que, no contexto, nada mais poderia recuperar, e que a civilização há muito havia sufocado. É, sem dúvida, uma maravilhosa metáfora que revela o poder da leitura na massa da própria literatura (espécie de espelho de múltiplos reflexos).

E o que é mais significativo: justamente num ambiente onde, ao que tudo indica, a leitura de nada parece servir na prática. Mas é por ela que se resiste. Onde houver um leitor, sobrevive (renasce, revigora-se) aquilo que remete ao inabarcável, ao imponderável, ao indomável, à floresta de desejos, de medos e de sentimentos que, no final das contas, cresce em cada um de nós.

Trecho

“Como fazia parte do primeiro turno, o velho apanhou a lamparina.
Seu companheiro de vigília o olhava, perplexo, percorrer com a lupa os signos ordenados no livro.
– É verdade que você sabe ler, compadre?
– Um pouco.
– E o que está lendo?
– Um romance. Mas fique quieto. Se você fala a chama se move, e as letras ficam dançando.
O outro se afastou para não incomodar, mas era tal a atenção que o velho dispensava ao livro que não suportou ficar à margem.
– De que trata?
– Do amor.
Diante da resposta do velho, o outro se aproximou com renovado interesse.
– Não me goze. Com fêmeas ricas, fogosas?
O velho fechou o livro de repente, fazendo vacilar a chama da lamparina.
– Não. Trata-se de outro amor. Do que dói.
O homem ficou decepcionado.”

Romar Belling é natural de Ovalle, no Chile, Luis Sepúlveda está em vias de completar 60 anos em 4 de outubro. Reside em Gijón, na Espanha. Um Velho que Lia Romances de Amor foi lançado no Brasil pela Ática, em 1993. Em 2005, ganhou o selo da Relume-Dumará (132 p.). A ele seguiram-se Mundo do Fim do Mundo (145 p.), de 1997, e Diário de um Killer Sentimental (125 p.), de 2006, ambos pela Relume-Dumará.

Fonte: A Gazeta do Sul.

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Não, o blog não vai morrer

Tenho sido bastante perguntado sobre o futuro do blog. Os questionamentos nascem da mudança ocorrida na rotina de postagens sobre os assuntos e polêmicas locais. O espaço tem sido ocupado por textos de terceiros, entre eles as excelentes crônicas do doutor xapuriense José Claudio, poesias de autores renomados e, como sempre aconteceu, por muito miolo de pote, que é sobre o que realmente sei escrever.

- Não, o blog não vai morrer, tenho respondido. 

Mas é certo que tanto a página quanto o autor necessitam ser repaginados. Conceitos devem ser revistos e as consequências de se intrometer tanto na vida de uma cidade tão pequena e de mentalidades tão medievais – resguardem-se as exceções – também precisam ser cuidadosamente reavaliadas. O Xapuri Agora se tornou muito conhecido e prestigiado por tanta gente, mas se fez também, por sua solidão, um alvo fixo de ações judiciais sempre julgadas improcedentes, mas inevitavelmente desgastantes.

Quando criei o blog, no ano de 2007, o fiz na esperança de ser seguido por outros, principalmente os mais jovens, para que em um determinado tempo a cidade pudesse contar com inúmeras páginas do tipo repercutindo os mais diversos assuntos da vida local. Uma razoável quantidade de blogs faria uma enorme diferença. As pessoas gostam de blogs e são atentas a eles quando se propõem a abordar temas de interesse geral.

Como isso não aconteceu, me tornei uma andorinha solitária que - como diz o velho provérbio – sozinha não consegue fazer verão. Ao contrário disso, tenho sido alvo único de chuvas e trovoadas oriundas de uma minoria que só aprecia a informação quando esta não lhe seja negativa ou desagradável ou mesmo não contrarie interesses políticos e pessoais de uma cambada de urubus. Se houvessem em Xapuri pelo menos 5 blogs abordando, cada um ao seu estilo, um mesmo assunto, as famigeradas ações judiciais se extinguiriam.

Dias atrás, na última ação que respondi no Juizado Cível de Xapuri contra uma reportagem que envolvia um policial militar, ouvi de um juiz leigo um pedido que me fez desestimular quase que completamente do meu trabalho e do futuro do país como Estado democrático. “Sei da importância do seu trabalho para a sociedade, mas maneire com o seu blog porque assim nós vamos trabalhar aqui para julgar apenas os seus processos”.

Não necessito me estender para que aqueles que me acompanham pela Rádio Educadora de Xapuri e pelo Xapuri Agora me compreendam. Tenho relatado aqui todas as ações na justiça, as ameaças e as discriminações que tenho sofrido por conta de meu trabalho. Elas não me amedrontam ou intimidam, mas confesso que me cansaram deveras. Daí a pausa e a reflexão sobre em que mudar para assim continuar.

Tenho plena convicção de que não tenho feito outra coisa senão prestar um importante serviço à sociedade xapuriense, tão carente de informação sobre aquilo que é de seu interesse. E não pretendo desistir das coisas sem as quais deixaria de ser eu mesmo. Mas, no atual momento, dedico-me a cuidar de alguns assuntos pessoais e a tentar reformular o blog, que, garanto, tão cedo não esticará as canelas.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Tribunais de contas

João Baptista Herkenhoff

Este texto, na sua versão original, foi publicado em Vitória porque está para ocorrer a nomeação de um novo membro do Tribunal de Contas no Espírito Santo.

Entretanto o tema não é local, mas nacional, motivo pelo qual cabe a divulgação deste artigo fora do território capixaba.

O Tribunal de Contas não integra o Poder Judiciário, embora tenha este nome de “tribunal”. Tem como missão julgar as contas dos administradores, apreciar a legalidade dos atos de admissão de pessoal, realizar inspeções e auditorias contábeis e zelar pela correta destinação do patrimônio e dos recursos públicos. No Espírito Santo o TC julga também as contas dos Prefeitos.

O desalento em face de repetidas omissões dos tribunais de contas levou um jornal respeitável, como a “Folha de São Paulo”, a defender a supressão dos mesmos.

Não subscrevo essa tese. Entretanto é indispensável que, sem mais tardança, os tribunais de contas cumpram a parte que lhes cabe na defesa da Ética.

As desonestidades, os atos de corrupção, nas suas mais sutis formas, constituem um escárnio, num país que precisa satisfazer carências básicas de seu povo sofrido.

Dinheiro que se desvia do uso honesto é dinheiro que se subtrai à educação, à saúde, aos projetos sociais, ao desenvolvimento do país.

Os crimes contra a administração, como o peculato, a concussão, a prevaricação, a corrupção em qualquer de suas modalidades, constituem delitos muito mais graves do que os crimes contra o patrimônio, como o furto, o roubo, a apropriação indébita.

Os crimes contra o patrimônio alcançam apenas pessoas individualmente consideradas. Os crimes contra a administração atingem o conjunto da população.

O povo, com muita sabedoria, deixa de lado a definição legal do roubo (subtrair coisa alheia móvel mediante grave ameaça ou violência) para dizer de um político desonesto que ele rouba, que ele é ladrão.

É essencial prevenir a corrupção, impossibilitar a conduta corrupta. Nesse aspecto é fundamental o papel dos tribunais de contas.

Tribunais de contas atuantes e onipresentes podem mudar o panorama de corrupção presente na vida brasileira, nas diversas esferas administrativas.

Os tribunais de contas devem ser realmente ''cortes de contas''. Que se exija do postulante ao cargo de conselheiro um passado moral ilibado, como determina a Constituição, e não apenas uma folha corrida sem mancha. Tripudiam sobre o povo, zombam da decência – administradores que nomeiam para os tribunais de contas pessoas destituídas de passado acima de qualquer suspeita.

João Baptista Herkenhoff é magistrado aposentado e escritor.

domingo, 7 de julho de 2013

Bem pobre, bem feliz...

JOSÉ CLÁUDIO MOTA PORFIRO

Observei há muito tempo, ainda lá em Xapuri, que algumas pessoas, apesar de pobres, se fazem passar por pedantes, arrogantes, orgulhosas, talvez, dos andrajos espirituais nos quais a alma encolhida se veste. Então, fui mais além e vi que delas a pobreza não gosta, isto porque ser pedante é marca registrada dos ricos. Os mais humildes têm mesmo é a obrigação de ser bem simples, do jeito que é a nossa alma sem fantasias. Bem pobre, bem feliz... Vejam só!

Lá havia uma certa elite endinheirada e feliz, talvez. Os nossos comerciantes trocavam borracha e castanha por tecidos ordinários, lamparinas venenosas e miçangas fedidas. Os seringalistas exploradores e perdulários davam as cartas em mesas de baralho nas quais o meu pai, às vezes, era o crupiê. Alguns poucos moravam em residências de alvenaria e bem pintadas, mas a superior maioria vivia mesmo em casas de madeira, algumas bem simples, outras quase choupanas e umas tantas com telhado português, teto bem trabalhado, beirais bordados, varandas com plantas bem cuidadas por empregadas domésticas que ganhavam uma mixaria, mas engordavam, porque comiam bem ou se saciavam apenas com os restos que caíam das mesas dos abastados. Já era alguma coisa para aquela moça que saíra do seringal para tentar a sorte na cidade sem ter que cair nas graças e nas camas dos patrões que lhes faziam filhos insólitos e desavisados.

A empregada de uma família que votava no PTB, partido do Guilherme Zaire e do Oscar Passos, do alto do jirau em que lavava louças, cantava assim:

Quando eles veem um qualquer do PTB

É logo esturrando, querendo até morder

Levantam a saia que é pra todo mundo vê

Que a bandeirola é do tal do PTB. (...)

Em resposta, a empregada da família vizinha, que lavava roupas ao redor de um camburão, cantarolava:

Senhor José da Cobra dê cobro à sua gente

Tranque bem a porta e ponha uma corrente

Porque doido na rua é pra fazer besteira

Oscar Passo olha o braço PSD é o maior.

E fui assim eu crescendo e aumentando o tamanho do quengo que cabia de tudo um pouco, e ainda lá enfiavam a Matemática, ensinada pelo João Garrinha, e o Português, ministrado pela Euri Figueiredo, além de outras que muito me serviram pela vida afora.

Em casa, uma moça que viera do seringal para estudar, cantava umas modas humildes do Teixeirinha, dentre as quais se destacava o Coração de Luto,que logo depois virou filme assistido por nove entre dez brasileiros de norte a sul, posto que o autor gaúcho era admirado nos seringais do Acre:

O maior golpe do mundo que eu tive na minha vida

Foi quando aos sete anos perdi minha mãe querida

Morreu queimada no fogo morte triste dolorida

Que fez a minha mãezinha dar o adeus da despedida.

Vinha vindo da escola quando de longe avistei

E o rancho em que nós morava cheio de gente encontrei

E antes que alguém me dissesse eu logo imaginei

Que o causo era de morte da mãezinha que amei (...)

Veja só como são as coisas, senhora Virgínia Célia...

Num desses dias luminosos, na quadra de esportes recentemente inaugurada, era a hora de as moças jogarem voleibol, uma vez que os rapazes jogariam futebol de salão à noite. Uma delas então disse a mim que alguns dentre os nossos, como eu, aproveitavam e participavam dos dois momentos, ao que eu tasquei:

- E por acaso vocês, moças, teriam número suficiente para compor dois times de voleibol?

 Ao que ela respondeu:

- Olha aí? Só quer ser. Todo falando difícil.

- Ora bolas! Eu sou dado às leituras. Você, não. E não só falo assim, mas escrevo. Você é que não me conhece, apesar de a sua mãe ser minha professora. – Foi esta a resposta enfática como jamais me houvera ocorrido.

Hoje, o fato me faz lembrar um aforismo espanhol segundo o qual nós nos acostumamos a aplaudir as tolices de um rico enquanto nunca damos ouvidos às máximas de um pobre... Não que eu mereça qualquer deferência por parte de quem quer que seja.

Em realidade, o Zé Cláudio era um adolescente caladão e dificilmente ouvido, talvez por ser um tanto desconfiado e sisudo, ou menos belo que os demais da claque que revirava os olhos ante a beleza das moças xapurienses da minha época.

Um dia, de mim vi a minha parca literatura nascendo em berço de ouro, na Xapuri do início dos anos setenta. Pari-a com algum esforço, como em todos os partos. Não lhe dei nome logo, mas, segundo parece-me, se a verdade não me engana e a realidade não me mente, depois, chamei-a Cobra Honorato, o livro infantil do Raul Bopp. Em pouco tempo, ela passou a se chamar O meu pé de Laranja Lima, do José Mauro de Vasconcelos. E foi assim... A cada ano ela levava uns cinco ou seis nomes e hoje o nome dela é A menina que roubava livros, do escritor alemão Markus Zusak

Falo-vos, minhas senhoras, do tempo não perdido, mas buscado, achado e encontrado na pequena biblioteca do meu Colégio Divina Providência...

É que lá em casa havia umas crianças muito arteiras e, a partir das dez da manhã, já plenamente acordadas, faziam um barulho ensurdecedor. Eram assim os meus irmãos mais novos. Dos cacetes.

Como as tarefas escolares eram feitas entre seis e dez horas, eu empreendia fuga rumo ao colégio das freiras, onde estudava à tarde. Lá chegando, a Irmã Alfreda Patrini, ou a Raquel Manfredini, ou a Regina Molinetti, muito solícitas, me deixavam adentrar o recinto de uma pequena biblioteca de mais ou menos sessenta metros quadrados.

Comecei admirando a enciclopédia Mirador Internacional que logo se tornou enjoativa nos seus dezoito tomos muito bem ilustrados. Depois, passeei por José de Alencar, Machado de Assis, José Lins do Rego, José Américo de Almeida, Graciliano Ramos, Rachel de Queirós, Castro Alves, Gonçalves Dias, dentre outros menos cotados. Um dia, então, depois de uns três anos, percebi que já nada ali era interessante, não porque eu houvesse lido tudo, mas porque fora do Colégio eu descobrira as viagens pornográficas contidas nos livros da Adelaide Carraro e da Cassandra Rios, uma bênção de Deus na vida de um moleque já cheio de espinhas e libidinagens... Ora vá! É influência de menos e literatura demais para quem não tinha o tostão com que adquirir as obras. Em verdade, emprestava-as de um outro sacana.

Cheguei por fim a uma conclusão estupenda. É que ainda sou um menino bem pobre, bem feliz. Por isto, serei eternamente grato ao destino por ter-me feito nascer sem arrimo. Essa genial pobreza foi a mim uma amiga benfazeja. Ela me ensinou o preço verdadeiro dos bens úteis à vida, que sem ela não teria conhecido. Quando ela me fez evitar o peso do luxo, me fez devoto da arte e da beleza.

Pranteia essa valsa, meu bom Vinícius de Moraes!

__________

*Cronista nascido e criado em Xapuri do Acre a partir de 1957.