A Constituição Brasileira garante o direito à livre expressão, mas veda o anonimato. Blogs que não mediam comentários podem ter aborrecimentos.
Por Cristiana Soares
Você leva um soco nas costas, olha para trás e não vê ninguém. Foi desta forma que meu amigo Sidney Garambone definiu o anonimato na internet. Apesar de se sentir duramente atingido em seu blog, o Garamblog, ele dá um show de intenção democrática, recusando-se a mediar seus comentários, que já chegaram em torno de 600 em apenas um dia. Garamba me pergunta: “o que você acha do anonimato na internet?” Fiquei sem resposta.
Anonimato na internet pode ser compreendido em duas instâncias: identidade anônima, que já gerou muita polêmica, em 2006, quando veio à baila o projeto de lei que preconiza o registro de usuários nos provedores de acesso; e o comentário anônimo.
A Constituição do Brasil deixa patente: “é livre a manifestação de pensamento, sendo vedado o anonimato.”
Porém, a internet não tem limites territoriais. Ela não é brasileira. Ela não é de ninguém. Como fica, então?
Patricia Peck, especialista em Direito Digital, em seu artigo Identidade digital obrigatória?, defende mudanças nas leis de acordo com os novos tempos.
Ela questiona: “Deve a internet permanecer anônima, que é o que vem desenhando sua natureza de liberdade até então? Ou o anonimato, como já se demonstrou em outros momentos de nossa evolução como civilização humana, é prejudicial e deve estar dosado e limitado, a exceções como denúncia, ou proteção de fonte de imprensa…?”
O professor Ethan Zuckerman, da Escola de Direito de Harvard, com o propósito de defender aqueles que queiram denunciar casos de corrupção e manter em sigilo sua identidade, publicou um guia, A Technical Guide to Anonymous Blogging, no site Techsoup.
Mudando o jogo
Hoje é possível rastrear uma conexão e chegar até o endereço de IP (Internet Protocol) do computador usado pelo anônimo. Mas impossível saber quem é o indivíduo, se o computador for compartilhado com outros usuários.
Por isso, cibercafés e lan houses são lugares visados. No Estado de São Paulo, desde o início do ano passado, entrou em vigor uma lei que obriga esses espaços a registrar e identificar seus clientes.
Para ludibriar os IPs e manter o anonimato na rede, um grupo de gurus da segurança criou o Torpark, que hoje atende pelo nome de Xerobank Browser. É um navegador que não deixa rastros de navegação. Ele é capaz de modificar o IP da máquina do usuário num vapt-vupt.
Descobrir uma identidade na internet pode não ser tão simples. E, segundo o blogueiro Carlos Cardoso, do Contraditorium, descobrir o autor de um comentário anônimo, nem se fala. Em um de seus posts, ele afirma: “tirando episódios de CSI e Lei e Ordem, na vida real é MUITO difícil traçar a origem de um comentário em um blog.”
Voltando ao meu amigo Garambone, sugeri a ele que, mesmo permitindo a participação de anônimos, criasse regras e as deixassem bem visíveis em seu blog, valendo-se do direito de mediar.
Acredito que isso não seja censura nem uma atitude antidemocrática, uma vez que as regras de participação estão explícitas. Esse procedimento já é corriqueiro em vários blogs e sites. Não sei se Garamba me ouviu…
Cardoso pontua em suas regras: “anonimato não é um direito, é um privilégio. Use-o bem ou perca-o.”, deixando claro que se o anônimo abusar não terá seu comentário publicado.
No blog da Trip, aparece, em destaque, na caixa de comentários: “A Trip reserva-se, desde já, o direito de excluir comentários e textos que julgar ofensivos, difamatórios, caluniosos, preconceituosos ou de alguma forma prejudiciais a terceiros. Textos de caráter promocional ou inseridos no sistema sem a devida identificação de seu autor (nome completo e endereço válido de e-mail) também poderão ser excluídos.”
E a editora complementa, comunicando que não é responsável pelas opiniões dos comentaristas, já que alguns blogueiros foram processados, anteriormente, por abrigarem em seu conteúdo opiniões de usuários consideradas abusivas.
O Blônicas, blog de crônicas, assim como o meu amigo Garambone, também libera geral. Já constatei lá a publicação de comentários anônimos constrangedores e até virulentos, com xingamentos e ofensas a granel. Democracia? Anarquia? Bundalelê? Casa da mãe Joana?
Sou completamente a favor da privacidade e da liberdade de expressão, mas estabelecer regras básicas, através da auto-regulamentação, não faz mal a ninguém. Ou faz? [Webinsider]
Sobre o autor
Cristiana Soares é publicitária e escreve no Blog Talk.
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