* Carlos Estevão Ferreira Castelo
Atualmente em minha função na UFAC, vez por outra tenho conversado com alunos e professores sobre empreendedorismo. Com os alunos em classe geralmente o papo é concluído da seguinte forma: “galera, isso não cai na prova não, mais pode acompanhá-los pelo resto de vossas vidas, dependendo do caminho que estejam decididos a trilhar”. Sinto, verdadeiramente, que ficam superinteressados neste tema. Pode ser porque percebem que nos dias de hoje o empreendedorismo é muito útil nas escolhas que cada um faz. Já para alguns “phdeuses” isso não é coisa para se estudar.
Na verdade acredito que empreendedorismo é uma escolha que não é boa nem ruim, melhor nem pior que outras, mas certamente é uma escolha que exige preparação e competência para vivê-la, com o risco de comprometer muito mais que apenas o tempo investido. Empreendedorismo supera a criação de empresas, é na verdade uma “forma de ser”.
Neste texto, portanto, o objetivo não é polemizar com as afirmativas de que “empreendedorismo não é coisa que se deva tratar na academia”, até porque aceito todas as opiniões incondicionalmente mesmo não concordando, o foco é apresentar algumas idéias sobre o tema baseados nas leituras que fiz de textos do educador canadense Louis Jacques Filion, principalmente sobre o conceito de Empreendedor de Negócios e sua relação com o Desenvolvimento Econômico.
Diferentemente da grande maioria daqueles que vêem na abertura de um pequeno negócio um caminho para compensar a falta de emprego, algo maior que a simples necessidade parece mover as decisões de um empreendedor de negócios. Há, com certeza, algo mais poderoso que só a falta de alternativas. Talvez essa mesma necessidade possa ser o início, mas definitivamente não é o fator que leva aos resultados e ao bem estar interno. A grande maioria daqueles que iniciam seus pequenos negócios, formais ou informais, sucumbem porque não existe nada mais que uma relação de necessidade com o que faz e só isto não é suficiente. Essa é minha crença.
Os primeiros pensadores identificados com o tema foram os economistas, especificamente Cantillon e Say. Cantillon foi um banqueiro que, atualmente seria um capitalista de risco. Ele foi o primeiro a tentar compreender o empreendedorismo como um todo. Afirmava Cantillon em seus escritos que os empreendedores eram pessoas que mediam as oportunidades com a visão para fazer lucros assumindo os riscos inerentes. Por exemplo: compravam matéria-prima – muitas vezes um produto agrícola – por um certo preço, para processá-lo e vendê-lo a um preço incerto. Portanto, os empreendedores seriam assumidores de riscos porque investiam seu próprio dinheiro.
Jean-Baptiste Say foi outro economista importante a dedicar interesse sobre os empreendedores. Na verdade foi Say o primeiro a colocar fundamento nesse campo, por isso é considerado o pai do empreendedorismo. Para Say o empreendedor é uma figura central no processo de desenvolvimento econômico. Da mesma forma que Cantillon, Say considerava o empreendedor um assumidor de riscos. Portanto, como o desenvolvimento econômico seria para ele resultado da criação de risco, os empreendedores ocupariam papel central no processo.
Entretanto, foi o Economista Shumpeter que sacramentou a importância dos empreendedores na explicação do desenvolvimento econômico das nações, associando-os à inovação. Para Shumpeter, a essência do empreendedorismo permanece na percepção e exploração de novas oportunidades no domínio dos negócios, sempre fazendo uso diferente dos recursos nacionais dos quais eles estão extraindo de seus empregos tradicionais e submetendo a novas combinações.
Além da inovação, como apontado, os economistas sempre estiveram preocupados em compreender o papel desempenhado pelos empreendedores como motores do sistema econômico capitalista. Mas o que chama a atenção na literatura econômica é o fato de que os empreendedores e sua importância sempre são mencionados, mas aparecem muito pouco nos modelos clássicos de desenvolvimento. De acordo com Louis Jacques Filion, nas vezes que os empreendedores aparecem nos modelos econômicos geralmente estão representados por uma função. Fillion afirma que a dificuldade para isso está na dificuldade de introduzir elementos de racionalidade no comportamento complexo dos empreendedores, o que pode ter dificultado para os economistas criarem uma ciência econômica do comportamento dos empreendedores. Na verdade, o fato de grande parte dos economistas sempre terem tido dificuldades em aceitar modelos não-quantificáveis pode ser um indício dos limites da ciência econômica para com o empreendedorismo. Isto pode explicar a migração dos estudos sobre esse campo para as ciências comportamentais.
Entre os comportamentalistas, o autor que mais se destacou no estudo dos empreendedores foi o psicólogo e Professor da Universidade de Harvard David C. McClelland. Depois de suas contribuições, as ciências do comportamento dominaram o campo do empreendedorismo até meados dos anos 80, onde o escopo do termo comportamento foi ampliado e não está mais na competência exclusiva dos comportamentalistas. A pesquisa parece deslocar-se para esferas como habilidades e competências requeridas por uma pessoa para atuar como empreendedor de negócios.
Para Louis Jacques Filion, um dos autores que têm se destacado na vertente das competências e habilidades para empreender, o empreendedor de negócios é “uma pessoa que imagina, desenvolve e realiza visões”, sendo esta visão “uma imagem, projetada no futuro, do lugar que se quer ver ocupado pelos seus produtos no mercado, assim como a imagem projetada do tipo de organização necessária para consegui-lo”. Ele sonha, mas age!
Como os empreendedores são muito importantes para o desenvolvimento da economia de qualquer país, pois são eles os maiores geradores de empregos, pagadores de impostos, contribuidores na geração de riquezas e responsáveis pela mudança no funcionamento das coisas, muitas pessoas passaram a estudar como eles atuam para poder ajudar outros que ainda não tiveram bons resultados em negócios, a obtê-los (e ainda dizem que não é coisa para se estudar).
Geralmente as pesquisas partem das empresas que deram certo. Observando elas, geralmente descobre-se que passam por algumas etapas muito semelhantes. Uma síntese da seqüência poderia ser:
1) Uma motivação pessoal para realizar algo que seja importante para o empreendedor;
2) Uma idéia de negócio que surge, normalmente, da própria motivação por empreender;
3) Surge uma visão emergente, onde ainda é uma idéia, mas, já mais amadurecida;
4) Esta visão emergente, através da obtenção de elementos concretos que demonstrem que esta visão ter algum sentido, transforma-se em uma visão central;
5) Continuando o desenvolvimento da visão, chega-se à oportunidade de negócio;
6) Identificada a oportunidade, passa-se a procurar um diferencial para poder sobressair-se da grande quantidade de concorrentes no mercado;
7) Com isto definido, passa-se a pensar em como vai ser organizado o negócio: como comprar, quem compra, quem vende, como operar, etc. Trata-se do ambiente da empresa e do seu funcionamento;
8) A partir daí vem a necessidade de planejar, ou seja, como fazer as coisas e em que seqüência;
9) Finalmente, implanta-se a empresa;
10)Implantado o negócio, passa-se para a fase de consolidação, onde os resultados definirão se os caminhos escolhidos foram os corretos;
11)Como o empreendedor é alguém que gosta de desafio, após a consolidação do negócio, ele passa a iniciar novamente o processo e procurar uma nova idéia para que possa expandir sua empresa, estabelecendo novos desafios;
Mais não é só isso, na verdade, são necessários ainda outros elementos para que o empreendedor possa concretizar sua idéia. Segundo a abordagem de Filion, os elementos necessários, e que ocorrem durante cada fase, são:
Conceito de si
É a auto-imagem e como esta interfere nas ações de cada um. Em síntese, as pessoas só realizam algo quando se julgam capazes de fazê-lo. Tomar consciência de seu potencial é fundamental para que todo o processo de empreender ocorra em sua plenitude.
Energia
Este fator é decisivo, principalmente para os micro e pequenos negócios, onde o empreendedor é responsável por tudo. A Energia está relacionada à quantidade e qualidade do tempo dedicado às ações necessárias para as coisas acontecerem. Este é o gás do empreendedor.
Liderança
A liderança é o elemento que está relacionado à capacidade de estar à frente das decisões, comandando o processo e fazendo as devidas escolhas. Só a liderança permite este conforto com a posição de fazer estas escolhas e assumir suas conseqüências com naturalidade.
Relacionamento
As relações do empreendedor se apresentam como elemento fundamental no processo de estabelecer seu próprio negócio. Sem este componente fica praticamente impossível realizar as visões, pois sozinho e sem as devidas orientações e informações de outros a estrada fica ainda mais difícil.
Espaço de si
Este elemento é um dos mais polêmicos na maneira de atuar do empreendedor. Para se ter uma idéia do conceito do espaço de si, basta perceber que aquelas pessoas que empreendem procuram um mínimo de espaço para transitar sem interferência de outros. Neste caso, se não houver este espaço ele o criará, pois depende dele para fazer as escolhas e tomar as decisões de forma autônoma e definitiva.
Conhecimento do setor
Este é o mais intuitivo dentre os elementos que complementam as etapas no processo de empreender. É natural que se procure estabelecer uma maior intimidade com o setor no qual se pretende atuar. Mas não é só natural como necessário. É a partir deste elemento que o empreendedor passa a testar se sua idéia tem consistência e se ele dispõe dos recursos necessários para tocar a empresa que pretende implantar.
* Professor de Teoria Econômica da UFAC (xapuriense@uol.com.br)
Um comentário:
Valeu Raimari,
Fique a vontade para publicar os artigos. Vou escrever sobre as impressões que tive de Xapuri quando estive ai na semana santa. Te envio depois.
Grande abraço,
Carlos Estevão
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