quinta-feira, 21 de março de 2013

Lá se foi Tia Vicência

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Valdecir Nicácio

Ela era uma daquelas mulheres que somente pessoas como Olga Benário, Nízia Floresta, Maria Bonita, Maria da Penha, Bárbara Heliodora podem ser. Pessoas para as quais não cabem adjetivos porque elas durante suas vidas foram sujeitos de ação, transformação e superação das realidade que suas vidas lhe impuseram.

Quem conheceu a história de vida da Tia Vicência sabe o quanto é capaz uma mulher como ela, magrinha, de aparência frágil, gestos mansos e delicados e voz macia capaz de entoar o hino dos soldados da borracha pelos quais ela foi uma das maiores defensoras.

Pra não cometer o equívoco que o Brasil cometeu com o Chico Mendes em reconhecer sua luta somente após a morte. A Tia Vicência teve seus dias de gloria no final do ano passado quando foi homenageada no Congresso Nacional em Brasília por sua história de vida e sua luta pelo reconhecimento dos direitos dos Soldados da Borracha. Ela foi tão desprendida que nem esperou pra gozar dos benefícios que eles irão usufruir graças em grande parte à sua luta.

Depois dessa viajem ela mostrava com orgulho para seus clientes as fotografias com muita gente famosa que fez questão de se deixar fotografar ao lado daquela pequena grande senhora.

É claro que Xapuri perde mais um grande símbolo. Ela que era ao mesmo tempo reverenciada por todos os visitantes que tinham seu restaurante como opção de uma boa e farta comida, também era uma espécie de mãe de fogão dos velhos solteirões do fim da vida como o meu pai Walter Nicácio o Guilherme Zaire, Raimundo Figueiredo e tantos outros que para eles, ela fazia questão de manter reservada uma mesa. Ela dizia que aquela mesa era para seus velhos filhos. Eu cheguei a me emocionar quando estive lá logo após a morte do meu pai e ela me levou pelo braço pra mostrar a mesa que era reservada para meu pai ainda estava lá arrumadinha como se a esperar pela chegada dele para a próxima refeição.

Há essa hora seus velhos filhos estão comemorando no céu a possibilidade de finalmente comerem uma boa comidinha caseira com gosto de comida do seringal como costumava definir sua própria comida, enquanto a nós só cabe nos contentar com esse prato amargo que nos foi servido hoje.

Valdecir Nicácio é xapuriense, mestre em Direitos Humanos pela Universidade de Essex-Inglaterra.

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