Em 2003, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Polícia Federal receberam um alerta: as terras da tribo indígena Ashaninka estavam sendo invadidas por madeireiros peruanos. A denúncia só foi possível graças à presença da internet naquela comunidade, situada no Acre, na fronteira entre Peru e Brasil. Sem acesso a qualquer outro meio de comunicação, os indígenas conseguiram enviar mensagens eletrônicas aos órgãos públicos brasileiros e chamaram atenção para o que estava acontecendo.
Histórias como essa ilustram a importância da internet não só para a sobrevivência de diversos povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos como para a própria proteção das florestas brasileiras. Na época, a comunidade Apiutxa do Rio Amônea era um dos pontos da Rede Povos da Floresta, que há cerca de quatro anos conecta à internet índios, quilombolas, ribeirinhos e populações extrativistas. Agora, graças ao apoio dos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e das Comunicações (Minicom), a Rede pretende ampliar seu projeto de inclusão digital dos povos da floresta. No dia 29 de março, os dois ministérios assinaram acordo de cooperação técnica para um projeto-piloto que pretende beneficiar inicialmente 150 comunidades, alcançando cerca de 200 mil pessoas.
Cerca de 50 dessas comunidades estão nos estados do Acre e do Amazonas. Local onde teve início a luta dos seringueiros pela criação de reservas extrativistas, a região do Alto Juruá, no Acre, que concentra mais da metade de seu território em uma área de conservação ambiental, vai abrigar cerca de 20 pontos do projeto, que terá apoio do programa Corredores Ecológicos, do MMA, e contará com a participação do governo estadual.
No estado do Amazonas, o projeto vai envolver populações ribeirinhas agroextrativistas que vivem na base de um Corredor Ecológico, o corredor Central da Amazônia, que se estende até a fronteira Brasil-Colômbia. Outros pólos do projeto vão beneficiar populações que vivem na região da BR-163 e comunidades indígenas na Bacia do Rio São Francisco.
O técnico Francisco de Assis Morais, da Diretoria de Educação Ambiental do MMA, enfatiza que o objetivo principal do projeto é “fortalecer o papel desses povos na proteção e gestão das florestas brasileiras”. Em sintonia com o movimento Pontos de Cultura, que faz parte do programa Cultura Viva, do Ministério da Cultura (MinC), a idéia é também fazer com que essas comunidades tenham acesso a notícias e informações e possam conhecer melhor seus direitos.
Segundo a Rede Povos da Floresta, a internet pode servir como meio de denúncia de invasões, roubo de madeira, desmatamentos e outras ameaças às florestas. Além de promover a vigilância, o controle e a fiscalização territorial, o objetivo é capacitar nas áreas de educação ambiental e desenvolvimento sustentável, assim como aproximar esses povos das novas tecnologias. Para o técnico, embora o computador e a internet sejam elementos estranhos à tradição de povos indígenas, ambos são hoje uma necessidade e exercem um papel fundamental na defesa da cultura e do território dessas comunidades. “Através da internet, podem ser disponibilizados serviços públicos essenciais a essas populações. Além disso, ela permite uma maior articulação entres os próprios povos e incentiva o diálogo com órgãos governamentais, favorecendo a gestão de áreas protegidas, muitas vezes localizadas em áreas remotas e de difícil acesso”.
Para Francisco Morais, a internet é um instrumento que pode favorecer a segurança desses povos, pois atua como um meio de defesa e afirmação de sua cultura. “Para esses povos, defender o lugar onde vivem, suas florestas e seu território é proteger sua cultura. Sem as florestas e toda a biodiversidade existentes em suas terras a cultura deles não sobrevive”, defende.
Além de antenas e outros serviços do programa Governo Eletrônico - Serviço de Atendimento ao Cidadão (Gesac), do Ministério das Comunicações, o projeto destinará placas solares para instalação de energia, estações com computador, teclados, impressoras, placas de rede e internet, além de outros acessórios. Para participar da iniciativa, as comunidades devem dispor de infra-estrutura adequada. Serão elas mesmas, com apoio do MMA e da Rede Povos da Floresta, as responsáveis pela gestão do projeto.
Revista do Terceiro Setor
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