Verdade seja dita

A militância do PT está de parabéns pela campanha realizada em Xapuri. Não há demérito na derrota petista, mas mérito em excesso na vitória tucana. Reconhecer isso é um sinal de grandeza de uma massa que fez um trabalho bonito, limpo e genuíno. Refiro-me aqui meramente à campanha - o trabalho e o esforço de quem vestiu a camisa vermelha e empunhou a bandeira com o mais puro e forte desejo de vencer a eleição.

O partido da estrela vermelha sempre teve dificuldades para ganhar eleições no município. Com exceção da ocasião em que o ex-prefeito Júlio Barbosa foi reeleito, no ano 2000, quando mesmo que não fizesse campanha venceria por ter feito um excelente primeiro mandato, o PT sempre precisou ter, por trás da militância, estratégias fortes e cabeças capazes de fazê-las funcionar, o que, definitivamente, não foi o caso nessa eleição.

O que sobrou de empolgação e brilhantismo nas ruas, com destaque para a militância jovem e a ala feminina, que protagonizou um dos momentos mais bonitos e originais de toda a campanha, o “Mulheraço do 13”, faltou em poder de articulação para a coordenação de campanha. E sem essa de melindres ou de dizer que estou culpando alguém pela derrota. Estou apenas ratificando que a força do partido não foi abalada no município, mas que houve falha no “intellectual core”.

A coordenação de campanha do PT não conseguiu fazer a leitura correta da disputa nos seus diversos momentos cruciais. Entoou-se um mantra de que as quatro candidaturas lançadas favoreciam o atual prefeito. Ledo engano. Marcinho Miranda esperava, quietinho como bom filho de mineiro, que uma enxurrada de votos desertores se derramasse sobre seu nome. Foi o que aconteceu na reta final, quando, atônito, o eleitorado de PSB e PV estourou.

Lembro-me bem que na eleição anterior a esta a candidatura de Bira Vasconcelos também não ia de vento em popa. Eram, como nessa, quatro candidaturas, em tese, extremamente fortes ao ponto de muita gente não arriscar qualquer palpite para o vencedor. Além de Bira, estavam no páreo o hoje deputado estadual Manoel Moraes (PSB), o então prefeito Wanderley Viana (PR) e o agora prefeito eleito, Marcinho Miranda (PSDB).

Em certo momento da campanha, o prefeito Wanderley Viana, candidato à reeleição, se vendo mal nas seguidas “pesquisas” que eram realizadas na cidade, acenou para a possibilidade de renunciar à campanha para apoiar Marcinho Miranda, o que seria desastroso para Bira Vasconcelos, do PT. Na coordenação da campanha, o ex-secretário adjunto de Saúde do governador Binho Marques, Sérgio Roberto Gomes de Souza, teve então uma ideia fenomenal.

Sérgio Roberto copiou na internet a matriz de uma consulta realizada por um instituto que perambula pelo Acre há alguns anos e inseriu nos campos em branco dados fictícios de uma pesquisa que “acabara de sair do forno”, mas que na realidade nunca existiu. Ali, o candidato da “Visão de Águia” subia do último para o segundo lugar, a apenas um ponto percentual do líder, o petista Bira Vasconcelos. Foi tiro e queda.

Quando cópias da suposta pesquisa se espalharam pelas ruas de Xapuri, Wanderley Viana se apossou de um carro de som e, aos berros característicos, retomou a campanha mudando os rumos daquela eleição, que foi vencida pelo PT. A jogada de mestre entrou para o folclore da política local e mostrou que numa disputa eleitoral acirrada tem que se ter ousadia e rapidez de raciocínio, caso contrário o bicho pega, como neste ano pegou. 

Nessa eleição de resultado funesto para o PT faltaram esses elementos: a frieza de raciocínio e visão apurada do cenário eleitoral. As placas do candidato do PSB dominavam a paisagem dos bairros periféricos recém beneficiados pelo programa Ruas do Povo e davam uma falsa impressão de que Wagner Menezes teria uma votação expressiva. Mesmo sabendo disso, os mentores da campanha petista não agiram. Ficaram sentados esperando pelo castigo, que veio a cavalo.

A possibilidade de debandada de eleitores para as bandas do PSDB deveria ter sido prevista pelos coordenadores da campanha. Marcinho Miranda chegou a ser visto cochichando com Wanderley Viana várias vezes. O candidato tucano já havia deixado de concorrer a deputado estadual nas eleições passadas para não prejudicar Manoel Moraes, que findou por se eleger. Essas são algumas conjecturas que podem explicar o êxodo de votos do 40 para o 45.

Marcinho Miranda, que não gosta de Wanderley e não morre de amores por Manoel Moraes, fez o seu papel. Fez política pura. Para vencer, dialogou até quem lhe atacava em palanque. Sobrou a ele o que sempre faltou a Bira Vasconcelos: traquejo político. Sobrou também ao candidato tucano comodidade na campanha. Não foi agredido por Bira. Digo agredido nos limites da arena política. Ele, mesmo não tendo argumentos para atacar Bira, atacou.

Faltou aos estrategistas do PT a leitura de A Arte da Guerra, não a de Maquiavel, mas a de Sun Tzu, que forja a figura de um general cujas qualidades são o segredo, a dissimulação e a surpresa. Política em período eleitoral não é um evento de confraternização, de troca de gentilezas e exercício exacerbado de benevolência, mas um campo de batalha em que para se vencer é necessário lançar mão de variados artifícios, entre eles a agressividade temperada com doses generosas de astúcia.