sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Estado refém do crime

As discussões em torno das mudanças na legislação ensejadas pela repercussão provocada pelo brutal assassinato do menino João Hélio, no Rio de Janeiro, na semana passada, mostram que o Brasil é refém da violência. Não se consegue, sequer, um consenso de opiniões sobre o que se pode e se deve ser mudado na legislação penal atrasada e leniente com todas as espécies de criminosos que infestam o país. Há uma maior preocupação com o bem estar de menores assassinos, do que com a segurança das pessoas de bem que são vítimas indefesas de toda a sorte de delinqüentes juvenis que matam de forma cruel e premeditada com a proteção da lei.


Especialistas afirmam que mudanças aprovadas pelo congresso nesta semana são insuficientes, veja:

"O Congresso aprovou nesta semana quatro projetos de lei para reforçar o combate à criminalidade no país. Para os especialistas da área, no entanto, ainda é muito pouco. Segundo eles, as primeiras medidas aprovadas representam um avanço - afinal, atacam o uso de menores por adultos em quadrilhas, dificultam os benefícios na pena aos autores de crimes hediondos e combatem o uso de celulares nas prisões. Mas muitos juristas e pesquisadores da área esperam providências mais fortes.

O ex-secretário Nacional Anti-Drogas do governo FHC, Walter Maierovitch, atual presidente de um instituto de pesquisa sobre criminalidade, acha que é necessária uma mudança mais ampla no sistema penal. "O semi-aberto está bem descaracterizado. O preso sai durante o dia e volta à noite. Quando ele sair, vai ter um chip de controle? Nunca houve controle algum. Eles podem voltar com drogas, com celular, o que é um clássico da vida carcerária no Brasil. O modelo semi-aberto continua inadequado, isso já furou, e vai continuar igual", disse ele em entrevista publicada nesta sexta-feira pelo jornal Folha de S. Paulo.

Para o diretor-executivo do Instituto Sou da Paz, Denis Mizne, as medidas votadas pelo Congresso são "boas, mas insuficientes". "O que falta é discutir como qualquer mudança pode ser efetivamente aplicada". Cláudio Beato, sociólogo, concorda: "Apenas o endurecimento das penas não adianta no âmbito legislativo. A questão crucial é a estrutura institucional para que tudo isso funcione. Nós somos um país de bacharéis, que acha que criando as leis está resolvido o problema".

Demagogia - Para alguns especialistas, os novos projetos aprovados no Congresso não funcionarão porque caminham na direção errada. " "Todas as medidas que vêm sendo discutidas apontam em uma só direção: manter as pessoas mais tempo na prisão. Fala-se em entupir ainda mais os presídios já superlotados, como se isso fosse solução. Não é", opina Hélio Bicudo, presidente da Fundação Inter americana de Defesa dos Direitos Humanos. Para Bicudo, as medidas aprovadas no Congresso nesta semana servem apenas para dar uma "satisfação demagógica" à população e não resolverão o problema.

Celso Limongi, presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, afirma que é "um erro querer mudar a legislação penal sob o impacto do pânico". "Até porque a lei penal trabalha com as conseqüências, não com as causas da criminalidade. É preciso que a sociedade se empenhe em mitigar a desigualdade social", defende ele. Rose Nogueira, do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana de SP, diz que o "aumento da ação repressiva do Estado não resolve".

  • Matéria publicada na edição online da revista Veja desta sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007.

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