quarta-feira, 25 de julho de 2007

Cachoeira mostra como se preserva

Kaxiana

Eles são em 80 famílias, que residem numa floresta de 24 mil hectares que lhes dão renda de R$ 6 mil anuais por família em atividades de manejo florestal sustentável à base principalmente da extração da borracha, da coleta da castanha e da extração do óleo de copaíba. A produção é vendida para cooperativas de Xapuri, que a comercializa no estado e em outras regiões brasileiras. E a floresta continua lá, em pé, frondosa e disponível para a produção de outras matérias-primas e para ajudar o mundo a não se aquecer tanto.

Estamos falando dos seringueiros do seringal Cachoeira, situado no município acreano de Xapuri, terra natal do sindicalista e ecologista Chico Mendes, que perdeu a vida justamente para eles viverem hoje em paz e em harmonia, produzindo e sustentando suas famílias sem precisar derrubar nada na maior e mais rica floresta tropical do planeta.

Foi exatamente a floresta densa e rica do seringal Cachoeira que encantou esta semana gestores ambientais de 41 países que participaram, em Rio Branco, capital do Acre, da Conferência Internacional de Manejo Comunitário, com direito até da presença da ministra do Meio Ambiente, a ex-seringueira Marina Silva, que fez muitos empates com Chico Mendes para evitar que a floresta acreana fosse derrubada por pecuaristas e madeireiros.

Em reportagem da jornalista Renata Brasileiro, do jornal Página 20, os gestores de vários países do mundo que possuem floresta tropical, particularmente os africanos, ficaram atentos e impressionados com a tamanha biodiversidade da floresta do seringal, outrora defendido por Chico Mendes e seus companheiros de luta em favor da selva acreana.

Segundo a reportagem, como os visitantes ao seringal Cachoeira ultrapassavam as 200 pessoas, várias equipes foram montadas para adentrarem as trilhas que levam às atividades madeireiras e não-madeireiras do seringal. Na visita aos locais de produção sustentável, todos eles foram guiados pelo presidente da Associação de Moradores e Produtores do Projeto Agroextrativista Chico Mendes, Nilson Teixeira Mendes, que vem a ser primo do sindicalista assassinado no Acre em 22 de dezembro de 1988.

“O presidente já foi uma atração à parte. Por ser primo do seringalista Chico Mendes, Nilson já ganhou a simpatia dos visitantes logo de início e passou a ser fotografado a cada parada feita na trilha para uma explicação sobre os recursos lá encontrados”, assinala a matéria.

“Estamos muito satisfeitos com esta atividade que a conferência está nos proporcionando, pois nos mostra as diversas maneiras de se desenvolver projetos que envolvem a comunidade e promovem o desenvolvimento sustentável. No meu país, a floresta também é tropical, portanto, não muito diferente do que eu estou vendo aqui. Mas a Amazônia possui, sem dúvidas, diferenciais que merecem ser observados”, comentou o representante do governo da Tanzânia, Charles Meschack.

A norte-americana Carina Bracer, que trabalha nos Estados Unidos em uma ong que capacita organizações com conhecimentos adquiridos a partir de experiências realizadas dentro e fora de seu país, disse à reportagem que estará levando para o seu país um conhecimento muito amplo da floresta amazônica.

“Aqui há espécies de árvores que eu não vi em lugar nenhum do mundo e que me parecem ter uma grande valor para quem trabalha em projetos comunitários. Mas o que mais me chamou a atenção - e é o que eu pretendo levar para os Estados Unidos - é o aspecto social, a maneira como se trabalha aqui, como esses movimentos surgiram e o meio de organização adotado pelas associações”, destacou Bracer.

Nas andanças dos gestores ambientais pelo seringal Cachoeira, o primo de Chico Mendes comentou relatório divulgado esta semana pela Organização Internacional de Madeiras Tropicais (ITTO) que afirma que empreendimentos florestais do Nepal a Camarões esbarram na burocracia, colocando em risco tanto as florestas tropicais quanto os ganhos de comunidades locais.

“É justamente pela falta de burocracias com relação aos projetos ambientais que o Acre, assim como outros Estados brasileiros, colhe grandes sucessos hoje”, destacou Nilson Mendes.
Para Mendes, o apoio dos governos é decisivo para o sucesso de projetos como o do manejo florestal comunitário do seringal Cachoeira.

“Nosso tripé de sustentação para que tudo isso dê certo é o incentivo que recebemos dos governos. Se não fôssemos incentivados, as comunidades não existiriam ou talvez não estivessem desempenhando hoje todas essas atividades com um resultado tão produtivo”, assinalou o seringueiro xapuriense.

Um empate feito por Chico Mendes

Veja, a seguir, um texto publicado pelo Comitê Chico Mendes (www.chicomendes.org) que relata um empate que o sindicalista acreano empreendeu nas matas de Xapuri para evitar que pecuaristas derrubassem a floresta.

“Seringal Cachoeira, colocação Fazendinha, a 30 quilômetros de Xapuri, 4 horas da madrugada, segunda-feira, 112 seringueiros, 34 mulheres e algumas crianças, iniciam a marcha de seis quilômetros pelo ramal da Cachoeira, rumo à sede da Fazenda São João Batista, Seringal Equador, onde está acontecendo um desmate. Objetivo: parar o desmate.

Às 5:30 horas o encontro, no meio do ramal com uma turma de aproximadamente 30 PMs, que estão ali para garantir a desmate. Os seringueiros desarmados e os PMs armados. Os PMs fazem uma barreira no ramal e começa um diálogo entre o sargento, comandante da guarnição e Chico Mendes, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri.

Chico Mendes explica que os seringueiros estão ali, defendendo a vida, defendendo a floresta que significa a sobrevivência de toda aquela gente e de seus filhos. O sargento, por sua vez, diz que eles não estão ali para defender proprietário de terra, mas para cumprir a lei. Ele explica que entre os soldados há filhos de seringueiros, que também são pais de família.

Acordo fechado

Os seringueiros propõem um acordo: sustação do desmate durante a segunda-feira, enquanto outras providências estariam sendo tomadas em outras esferas. O sargento diz que só o tenente, comandante da guarnição, poderia dar uma resposta.

Os dois lados ficam dialogando enquanto esperam a chegado do tenente, que já vem chegando. Dá um "bom dia" e logo começa a escutar as explicações dos seringueiros, do porquê daquela marcha, não sem antes ser informado de que todos estavam desarmados. Colocado diante da proposta de acordo de sustação do desmate por um dia, o tenente diz que se afastaria um pouco para debater com seus comandados, não sem antes "impor" - "não, desculpe", corrigiu ele "sugerir" que todos os participantes da marcha retornassem aos seus lugares de origem.
Os dois lados se afastam e enquanto os PMs conversam, retirados cerca de 200 metros, os seringueiros discutem e votam a decisão de aceitarem a sugestão do tenente de retirar-se, caso o desmate pare por um dia. Os dois grupos retornam e um aperto de mão entre o tenente e Chico Mendes sela o acordo provisório.

O tenente deu sua palavra de que o desmate ficaria paralisado por toda a Segunda-feira, enquanto uma comissão dos seringueiros iria a Xapuri, ver se já havia chegado de Curitiba um advogado do IEA - Instituto de Estudos Amazônicos, cedido ao Conselho Nacional de Seringueiros, que iria entrar com ação cautelar contra a licença de desmate concedida pelo IBDF à Delta Construções, proprietária de área de 2.000 hectares, no seringal Equador, no local chamado pelos seringueiros de Recanto, mas que os novos proprietários chamam de Fazenda São João Batista.

Atoleiro no caminho

PMs, no caminhão da Construtora Delta e seringueiros em sua Toyota retornam a Xapuri. Os PMs pedem para ir à frente, para que os seringueiros ajudassem a desatolar o caminhão, o que efetivamente aconteceu por duas vezes num clima de solidariedade.

Chegando a Xapuri, no Sindicato dos Trabalhadores Rurais, em telefonema para Curitiba, os seringueiros ficam sabendo que o advogado do I.E.A., saído terça-feira de Curitiba, somente ontem, quarta-feira, poderia estar entrando em ação cautelar em Xapuri. Em vista disso, Chico Mendes telefona para o Conselho de Segurança Nacional, onde o coronel Nascimento se prontificou a passar um telex ao IBDF sustando o desmate por cinco dias, para que o advogado tivesse tempo de entrar com a ação e para evitar conseqüências desagradáveis ante a irredutibilidade dos seringueiros, em sua posiçâo de não permitir desmates em áreas de seringueiras e castanheiras”.

Leia o texto original em Agência de Notícias Kaxiana

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