sábado, 29 de setembro de 2012

Boá

Rubens Santana de Menezes

Foi batizado por padre Felipe Gallerani com o nome de Maurício, mas um colega de infância, gozador e que atendia por Ernesto Abuache, deu-lhe o apelido de Boá.

Segundo a versão de Ernesto, a mãe de Boá, tinha problemas com a fala e consequentemente uma dicção prá lá de horrorosa. E como não conseguia articular corretamente a palavra Maurício, o máximo que saía era:

- Boarício! Acabou a água.

- Boarício! Vem prá casa.

E assim, por obra da insistência do gozador Ernesto, ficou conhecido um dos melhores jogadores do futebol acreano de todos os tempos.

Segundo o próprio, órfão de pai aos sete anos de idade, vivia sendo levado ao Fórum por Seu Sabino, sob ordens de Dr. Gondim. Tido por todos da época como uma fera, pior que o Gogão.

Numa das vezes, escondido num matagal próximo, armado de uma baladeira, Boá foi à forra: disparava pelotas de barro sobre a cobertura do Fórum, bem onde ficava enjaulada a fera. Quero dizer onde despachava o Meritíssimo Juiz da Comarca de Xapuri.

- Sabino! Vá ver quem está atirando pedras sobre o telhado. Ordenava ele.

E lá saía o pobre Oficial de Justiça a fazer papel de investigador policial.
A diligência resultava infrutífera, já que o Boá, embrenhado no matagal, ficava quieto até a ameaça passar. Após isto, novos pelotaços caíam sobre o teto do Gondim.

Um dia, por excesso de confiança, eis que o Sabino dá-lhe o flagrante. Levado à frente do Juiz, recebeu a pena:

- Montar o jardim do Fórum!

O adubo seria retirado dos currais da fazenda Monte Líbano. Segundo o Boá, tarefa prá mais de um mês. Era afilhado de Dr. Eugênio Raulino, segundo os mais antigos: advogado, promotor, professor, jornalista, escritor, poeta e putanheiro.

Num dos arraiais, o padrinho arrematou uma bandeja de pastéis e chamando a Boá, incumbiu-o de levá-los à casa de uma de suas muitas amantes; no caso a que estaria escalada para aquela noite.

Boá recebeu a bandeja, chamou sua turma e comeram todos os pastéis até ser necessário mantê-los na boca com o auxílio dos dedos. A bandeja, de papelão, ficou jogada por ali mesmo.

Quando o padrinho chegou ao local escolhido para o pernoite e perguntou pelas guloseimas, ouviu:

- Que pastéis?!

No dia seguinte, lá estava o Boá, mais uma vez, frente a frente com o Gondim.
Ao encontrar o carrossel montado em frente à igreja sem vigilância, Boá e Zé Bacu resolveram divertir-se sem o devido pagamento. Descoberta a travessura por frei Tomás, foi punido com uma lambada de cinto desferida pelo religioso.

Tanto aprontou que, aos catorze anos, sua mãe resolveu mudar-se para Rio Branco.
Diz Boá que nunca gostou de jogar futebol. O que ele queria mesmo era lutar boxe. E foi ao praticar o nobre esporte que recebeu um direto no queixo. Apagou na hora! E o futebol, por vias tortas, ganhou mais um adepto.

Sem gostar, jogava tudo aquilo. Imaginem se gostasse!

Rubens Santana de Menezes, o Rubinho, é professor aposentado e contador de muitas histórias.

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