sexta-feira, 23 de setembro de 2011

UARS, Skylab e democracia

UARS

As informações sobre a queda do satélite artificial norte-americano UARS, prevista para acontecer nas próximas horas, me fizeram lembrar um episódio parecido, quando a estação espacial Skylab – também colocada em órbita pelos EUA na década de 1970 - reentrou na atmosfera causando em vários lugares do mundo ataques de temor e sensacionalismo.

Em Xapuri não foi diferente. Como naquela época o único veículo de informação de massa por essas bandas era o rádio, e mesmo assim nem todo mundo que o ouvia compreendia bem o que escutava, as notícias sobre a queda da Skylab, termo que em inglês significa “laboratório do céu”, causaram uma onda de medo na população que temia desde de ser atingida por um pedaço do lixo espacial até à possibilidade de o evento significar o fim do mundo.

A Skylab se desintegrou na entrada na atmosfera no ano de 1979, espalhando pedaços de sua estrutura sobre o Oceano Índico e a Austrália, mas no início da década de 1980, havia ainda quem espalhasse por Xapuri a apocalíptica informação de que a estação espacial desabaria a qualquer momento sobre as nossas cabeças, podendo destruir toda a cidade.

Menino ainda, aos 10 ou 11 anos de idade, eu não tinha a menor noção de que o espaço seria uma espécie de terreno baldio cheio de lixo tecnológico, mas levava a história da queda daquela coisa terrível muito a sério e, confesso, morria de medo quando ouvia falar no assunto.

Mas, depois de crescido, descobri que naqueles tempos em que a Skylab esteve no céu, estivemos expostos a perigos bem maiores e mais graves que ser atingido por um pedaço de lata espacial ambulante. Vivíamos, no mundo, a temida Guerra Fria, com a ameaça de uma hecatombe nuclear, e, no Brasil, uma sangrenta ditadura militar que dava fim a milhares de vidas e solapava direitos políticos e humanos.

No mesmo ano em que a Skylab teve o seu fim, o Brasil começou a viver o advento da abertura política, através da Lei de Anistia (Lei Federal 6.683 de 1979), promulgada pelo então presidente João Figueiredo, que beneficiava 4.650 pessoas entre cassados, banidos, exilados ou simplesmente destituídos dos seus empregos.

Um pouco mais tarde, o Muro de Berlim foi ao chão como marco fundamental do fim da Guerra Fria, consolidado mais adiante com o gradual desmantelamento da antiga União Soviética e com os acordos pelo desarmamento mundial (com relação a armas atômicas) que tornaram o mundo “menos perigoso”, por assim dizer.

Trazendo para o campo mais local, pouco depois da queda da Skylab o Acre começou a viver a revolução que, a partir do assassinato de Wilson Pinheiro, em Brasiléia, no ano de 1980, e passando pelo semelhante destino de Chico Mendes, em Xapuri, em 1988, resultou nas grandes transformações políticas e sociais que o estado antes dominado pela pistolagem no campo e pelo crime organizado na cidade passou a experimentar.

É inegável que o UARS vai cair em um mundo bem melhor que o da velha Skylab, a despeito de o ser humano ainda padecer de infinitos problemas que se negam a ser equacionados por quem conduz os destinos do planeta. E aí estão as graves questões da miséria e da fome, da intolerância religiosa e da ambição econômica que geram guerras, além da corrupção que resulta em outras tantas mazelas que afligem o ser humano.

Como insisto em me negar ao pessimismo, opto por acreditar que, mais do que a possibilidade de cair sobre as nossas cabeças na passagem desta sexta-feira para sábado, a “Nova Skylab” possa marcar o início de uma nova fase de mudanças positivas para o mundo de hoje, em todos os aspectos, mas principalmente naqueles que afetem de maneira direta a qualidade de vida dos seres humanos independentemente do lugar onde vivam.

E como é impossível prever o que pode vir a acontecer nesse planeta em que as bolsas de valores insistem em estar nervosas e onde a convivência entre o homem e seu próprio meio ambiente está sempre prestes a entrar em colapso, que pelo menos continuemos, os povos que gozam desses privilégios, a usufruir da liberdade e da democracia, mesmo que esses valores tão fundamentais ao ser humano nem sempre sejam absolutos.

Um comentário:

Acea disse...

E como xapuriense tem uma criatividade ímpar, Skylab se tornou um dos mais famosos bares da década de 80. Lembro bem, não frequentei pq na época era uma criança, você que é bem mais velho deve ter tomado uma "água" gelada por lá.
Leônidas Badaró, jornalista e apaixonado por Xapuri e pelo seu povo.