sábado, 31 de dezembro de 2011

Ponto Chic restaurado e democratizado

Sérgio Roberto Gomes de Souza

Fala-se em Xapuri de uma mobilização para “revigorar” o “Ponto Chic”, antigo clube da cidade onde se degustavam bebidas, jogavam partidas de bilhar e realizavam festas. A ideia é interessante, no entanto, tenho algumas ressalvas.

O “Ponto Chic” sempre foi um espaço restrito, de exclusão. Suas festas, incluindo seu carnaval, foram reservados a uma certa “aristocracia” local, se é que podemos usar o termo. Dele sempre passaram distantes os que alguns insistem em ter como “indesejáveis”. As camadas mais pobres de Xapuri nunca foram bem-vindas.

No dia 23 de dezembro fui a um evento realizado no Clube, lá chegando, encontrei rostos e sons conhecidos, tive certa sensação de Déjà vu. O ambiente estava por demais agradável com o Magão, o Luís Beleza e o Almir entoando belas melodias e pessoas agradáveis circulando pelo ambiente. Estava com meu grande amigo Chiquinho Barbosa com quem travei boas prosas. Claro que não estava perfeito, afinal, faltava alguém muito importante, a Daniele, meu amor.

Pode parecer implicância, mas, alguma coisa além da “Dani” faltava no local. Percebi somente depois, faltava “alma”. O local, na penumbra, parecia satisfazer-se com os poucos que lá estavam e parecia repetir: “este é o ambiente restrito onde só se ‘encaixam’ os que têm certo perfil ‘estético’ e ‘moral’ adequado”.

Nas minhas conversas com o Chiquinho Barbosa percebi como ele, ao contrário de outros, poucas lembranças tinha do lugar. Chiquinho nasceu, foi criado e se constituiu como militante dos movimentos sociais no seringal. Tornou-se posteriormente, por méritos próprios, vereador em Xapuri. Foi ai que percebi: o “Ponto Chic”, parece padecer de uma maldição: ele não suporta, como diz Michelle Perrot, “os excluídos da História”.

No entanto, a presença de alguns personagens chamou atenção. Lá estava o meu grande amigo Wanderley Peres (Pererequinha) e seus familiares em uma mesa, esbanjando alegria. Rebusquei minhas memórias e lembrei-me do período em que ficávamos tentando entrar no “Ponto Chic” sem conseguirmos, contávamos no período com a parceria do Paulo Sérgio e, em algumas vezes, do meu primo/irmão Julinho Figueiredo. Apareceu um fio de esperança: lá estavam o Chiquinho e o Wanderley muito a vontade no local e percebi, podemos tomar este espaço da “aristocracia” e transformá-lo em um espaço democrático. Poderíamos romper com a dicotomia que sempre existiu em Xapuri: Os “indesejáveis” vão para o “Forro do Juvenal” - local que frequento com muita assiduidade e adoro – e os “desejáveis” no “Ponto Chic”.

Recordei-me, então, de quando Marilena Chauí assumiu o cargo de Secretária de Cultura na gestão da prefeita Luiza Erundina, em São Paulo. No período, Marilena abriu as portas do Teatro Municipal, espaço de muita ostentação, para que alunos de escolas públicas e pessoas de baixa renda frequentassem. Marilena Chauí democratizou um espaço aristocrático.

Sugiro o mesmo com o “Ponto Chic”. Vamos nos mobilizar para que o espaço seja restaurado, no entanto, que não se promova uma “assepsia” de sujeitos sociais. Experiências assim são desastrosas. Em Rio Branco, por exemplo, com a derrubada das casas de madeira que se apinhavam na Praça da Bandeira e a construção do que o governo denominou como “Novo Mercado Velho”, muitos sujeitos sociais que estavam ali há décadas foram excluídos. Eles não eram personagens desejáveis na nova estética que foi estabelecida. Como frequentador do Velho Mercado, convivi com muitos destes personagens: o Cupuaçu, a Loira do bar, o Pato Rouco, o Leví, o Paraíba, a saudosa D. Dulce, para citar alguns. Estes sujeitos desapareceram e ninguém dá notícia.

Revigorar o “Ponto Chic” pode ser uma ótima opção, se democratizarmos o acesso ao clube. Ele precisa ser um espaço caracterizado pela diversidade de sons, sujeitos, estéticas e concepções. À harmoniosa musicalidade do Magão, Beleza e Almir, deve somar-se o som dos forrós do Forró do Juvenal; aos “bailes de gala” os festejos populares.

Por fim, destaco que não sou contrário a ideia, apenas faço algumas ressalvas, aproveito para louvar a atitude dos professores Rubens (Rubinho) e Carlos Estevão, figuras que nunca esqueceram suas origens e muito orgulham Xapuri. Mas insisto, vamos democratizar o “Ponto Chic” e, se de todo caso não der certo, pedimos para o Julinho Figueiredo compor um samba para o local. Vai ser tiro e queda.

Sérgio Roberto Gomes de Souza – xapuriense, professor da UFAC

2 comentários:

xapuriense disse...

Penso que o argumento principal no pequeno e inteligente texto de Sergio está correto.

De minha parte, a idéia era essa mesmo: resgatar o local, democratizando-o.

As primeiras conversas foram sobre uma possivel transformação do local em um espaço cultural, para todos. O que não será tarefa fácil.

Carlos

carlos roney de figueiredo hadad disse...

Lendo o texto do Sérgio, lembrei-me de grandes festas e carnavais que tivemos e participamos no Ponto Chic, inclusive vários em que eu, Paulo Sérgio, Wanderlei e o Sérgio Roberto estávamos juntos, brincando, bebendo, curtindo.....boas lembranças. Abraços.

Carlos Hadad