Ecio Rodrigues (*)
O uso sustentável do ecossistema florestal, na Amazônia, realizado por produtores extrativistas tem sido apontado como um caminho importante para garantir a manutenção da floresta e evitar sua substituição pelo plantio de cana-de-açúcar, criação de gado, ou outras culturas agrícolas, como a soja.
Espera-se que o extrativismo, praticado com inovações tecnológicas que lhe forneça sustentabilidade econômica e ecológica, possa atender as necessidades de consumo do produtor, impedindo que ele caia nas tentações, inúmeras por sinal, trazidas pela agropecuária. Tentações que, infelizmente, em sua maioria, ainda são criadas por uma ação pública deveras equivocada.
Ocorre que as populações tradicionais, incluindo aí os ribeirinhos, pescadores, seringueiros, castanheiros, caucheiros, balateiros, índios, carnaubeiros, quebradeiras de coco babaçu, entre outros, praticam a exploração de vários produtos da floresta, de maneira permanente e sustentável, há mais de cem anos. Empregam o denominado modo extrativista de produção que tem no ecossistema florestal seu principal estoque de matéria-prima. Isto é, a destruição da floresta significa a destruição desse estoque e, por isso, o extrativismo contribui para evitar os desmatamentos.
Por isso, o extrativismo e as respectivas populações tradicionais que o pratica precisavam de um modelo diferenciado de regularização fundiária para suas florestas. A criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável como, por exemplo, a Reserva Extrativista Chico Mendes no Acre, foi justificada com base na importância do extrativismo para a Amazônia. Hoje, em toda região amazônica, existe uma área maior que a do território acreano destinada às Reservas Extrativistas.
Nessas áreas, somente o uso múltiplo e de maneira sustentável do ecossistema florestal é legalmente recomendado como atividade econômica para criar emprego e renda. Por outro lado, a agropecuária com fins comerciais é legalmente proibida.
Faltava, por fim, conceber inovações tecnológicas que permitissem ampliar a eficiência do uso atual que as populações tradicionais fazem da floresta. Com novas tecnologias, esperava-se estar colaborando para promover a produtividade do modo extrativista de produção melhorando seu desempenho em termos econômicos, sociais e ecológicos. Alçando o extrativismo à condição de importante mecanismo para o desenvolvimento sustentável da Amazônia.
Ao afirmar que o uso sustentável, praticado pelas populações tradicionais, é possível em nível de comunidades, a solução se encontraria no jeito de fazer. Tratava-se dessa maneira do emprego de uma tecnologia, denominada de Manejo Florestal de Uso Múltiplo, que foi desenvolvida na própria região amazônica, e já demonstrou ser capaz de promover a sustentabilidade do extrativismo florestal na região.
No caso específico das populações tradicionais e sua relação com a diversidade biológica da Amazônia, o manejo florestal de uso múltiplo mostra-se não só possível, mas, talvez, a única alternativa tanto para a permanência das populações no interior desse ecossistema, quanto para a conservação da própria floresta.
Isto é, parece ocorrer uma relação de dupla dependência: o extrativista, agora manejador florestal, depende dos recursos que maneja assim como a floresta depende dos manejadores para demonstrar seu potencial de geração de emprego e renda, e assim, continuar a existir.
Nos tempos de aquecimento global e desequilíbrio climático, onde a manutenção da floresta na Amazônia tornou-se um imperativo mundial, o extrativista e sua peculiar dupla dependência surgem como prioridade. Ao contribuir para evitar os desmatamentos e as queimadas, certamente, as populações tradicionais extrativistas estarão ajudando a salvar o planeta.
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(*) Ecio Rodrigues é professor da Universidade Federal do Acre (Ufac) e Doutor em Desenvolvimento Sustentável pela UnB.
- Texto extraído da Agência de Notícias Kaxiana.
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