quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

História

Do blog Xapuri News

Falar da Festa de São Sebastião é reviver um tempo de prosperidade e ao mesmo de agonia em Xapuri. É relembrar das figuras que povoam a memória do Xapurienses, é lembrar da Dona Venília, do Sr. Tufic Salim, do Sr. Camurim, do Sr. Guilherme Zaire, da Irmã Madre Petronilla, Padre Felipe Gallerani que se incumbiram de deixar os primeiros relatos sobre a festa, dos saudosos músicos Zeca Torres, Pituba, Oscar, Aurélio, Beijuba entre tantos outros. Não que sejam da minha época, mas de tanto ouvir falar dessas pessoas acabei me familiarizando com todas e corri atrás da vida de cada um e do principal de suas imagens.

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A lista é grande e não vou ser injusto em deixar alguns nomes sem citação, mas mesmo que 95% dessas pessoas já tenham adormecido para a eternidade é fácil ainda encontrarmos entres as pessoas acima de 60 anos depoimentos que surgem sem maiores dificuldades e com muita emoção de como era a Festa de São Sebastião. Agricultores, políticos, ex-seringalistas, seringueiros, professores, estudantes e aposentados do “Funrural” falam com muito ardor sobre a importância da festa comemorada anualmente em Xapuri. Sem importância e insignificante é o número dos que não querem prestar informações. Aliás, o reacionarismo, o medo de falar e a subserviência, até de pensamentos, são legados coloniais que atravessaram séculos e ainda hoje vivem nas cabeças de certos infelizes.

Assim, de conversa em conversa, bate papo ali e acolá, é possível em Xapuri aprendermos aspectos circunstanciais da primeira vez em que a festa foi realizada. Sempre há uma primeira vez. É claro que não há uma segurança nas informações já que os depoimentos colhidos destas pessoas são baseados no relato de seus antepassados e na própria experiência, mas dão conta de que no dia 20 de janeiro de 1902 um grupo de cem pessoas realizou a primeira procissão de São Sebastião na incipiente Xapuri.

A época era de conflito armado entre tropas regulares da Bolívia e seringueiros do Acre. Passados 8 meses da realização daquele ato religioso, Xapuri foi invadido por Plácido de Castro e seus homens em 6 de agosto de 1902. O intendente Juan de Dios Barrientos foi dominado e expurgado juntamente com seus assessores. "E a Vila Mariscal Sucre voltava a ser a Xapuri das tradições brasileiras”.

Os depoimentos revelam, então, que o ato religioso surgiu como um conforto espiritual. A escolha do santo deveu-se ao fato de São Sebastião ser considerado "protetor contra as guerras e pestes". Ninguém sabe explicar haver sido a primeira procissão liderada por um sacerdote ou um leigo.

Daí por diante, a festa foi acontecendo ano a ano — não como mera repetição, porque a história não se repete. Ela foi tomando corpo, crescendo e se reproduzindo de tal forma, que já em 1918 era o acontecimento mais importante da cidade. O “Vinte”, como passou a ser denominado, tornou-se bem mais um dia de oração e romaria, uma data de negócios, tais como chegadas de navios, chatas e lanchões para o desembarque de mercadorias e embarque de borracha, castanha e couros; pagamento de saldos dos seringueiros, aviamentos, além da realização de jogos de azar, de bailes populares e fechados e dos arraiais de vendedores de iguarias.

No período de 1920/30, a religião, a devoção ao santo padroeiro passa a ter um papel secundário, apesar de historicamente serem o móvel da festa. O ponto culminante já não era mais rezar ou pagar promessas. A oração e a fé continuavam num povo profundamente crente, mas a finalidade do vinte era mais do que isso. A Igreja como instituição milenar resistiu e continuou em cena, aparentemente o centro de tudo, prosseguiu fazendo procissões para milhares de romeiros, recebendo dádivas, fazendo casamentos, batizados e confissões de grande massa de fiéis. Eram exploradores e explorados contritos a ajoelhar-se aos pés do sacerdote para obter perdão pelos erros cometidos nas selvas.

Os saudosos Francisco Fidélis e Raimundo Paes, segundo o também já falecido Josué Fernandes em Seu Livro Festa de São Sebastião, diziam que “a fé no santo padroeiro continua de pé” ,mas que o capital, no decorrer dos anos, foi ocupando velozmente o espaço e tudo passou a girar em torno do lucro e consequentemente da exploração. Ambos afirmam que antigamente a exploração era mais branda "e a gente sobrevivia". Vale observar que a época de exploração "branda" a que esses dois testemunhos se referem remonta à data em que as classes sociais do Acre eram formadas por seringalistas e seringueiros. O produtor direto, o seringueiro, estava historicamente ligado aos donos dos meios de produção e, por isso, não havendo outros meios de exploração econômica a não ser o extrativismo e o comércio tradicional de aviamento, Paes e Fidélis chamam-na época de exploração "branda".

Para quem não se lembra do Sr. Raimundo Paes, era uma figura típica do Ceará, com uma das pernas amputadas e em conversas para o jornal Rio Branco de 1981 ele dizia “que há 30 ou 40 anos atrás as festas de São Sebastião tinham início no dia 10 de janeiro, prolongando-se até 23. Quanto aos divertimentos existentes esclareceu que havia Carrossel movido a braço, jogos e bailes: "A gente dançava no clube do Púpio, do Riad, no Pega (onde hoje é o Mercadinho do povo); havia menos gente, mas as festas eram animadas.

No mês de janeiro era comum ver ancorados os navios Benjamin, Zé Florêncio, Si, Bittar, O Republicano, O Sobralense, O Almirante e ainda as chatas Diamante Sorocaba, fora as lanchas que não estão listadas nos anais da história, já que se for procurar pouquíssima coisa se tem desta época." Tempos de vacas gordas da condição de fartura em que vivia, na época, o município.

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