Morto ontem após meses de internação, Chico Anysio criou 209 personagens, muitos inesquecíveis, ao longo de 65 anos de carreira.
“Não tenho medo de morrer. Só acho uma pena, quando ainda tenho tanta coisa a fazer. Mas não posso lutar contra o inevitável”
Duzentos personagens, oito filhos, seis mulheres, várias declarações polêmicas, muita vontade de ajudar quem sempre viveu do humor, alguns desafetos no percurso, mas também gerações influenciadas por ele e um país de admiradores ao longo de 65 anos de carreira. Chico Anysio se vangloriava de ser nordestino, daqueles que não fogem à luta. E foi assim até o fim.
Maior humorista da TV brasileira, ele não se rendeu facilmente e, nos últimos três meses, travou um batalha pela vida, mas não resistiu. Chico morreu ontem, aos 80 anos, no Hospital Samaritano, em Botafogo, no Rio. “Não tenho medo de morrer. Só acho uma pena, quando ainda tenho tanta coisa a fazer, para ver, tanto filho para ajudar, tanto neto. Mas não posso lutar contra o inevitável”, disse Chico, em maio de 2011.
No começo do ano passado, o artista teve problemas cardiorrespiratórios e ficou no hospital por quase quatro meses. Durante os 110 dias, o humorista esteve por 78 deles num CTI, sendo que em coma induzido por 22. Chico se recuperou a tempo de comemorar seus 80 anos em casa, no dia 12 de abril de 2011.
A ideia inicial de Chico era estudar para ser advogado, mas a veia cômica e a necessidade de trabalhar mudaram seus planos. Ao longo da vida assumiu a identidade de dezenas de personagens – a citar, Professor Raimundo, Bozó, Painho, Coalhada, Alberto Roberto, Justus Veríssimo, Salomé, Bento Carneiro, Pantaleão, Nazareno, Haroldo e Azambuja, entre tantos outros. Nas suas contas, foram 209 personagens.
Ele se casou seis vezes – entre elas com a ex-ministra Zélia Cardoso de Mello. Ele deixa a mulher Malga di Paula e os filhos Lug de Paula, Nizo Neto, Rico Rondelli, André Lucas, Cícero Chaves, Bruno Mazzeo, Rodrigo e Vitória. A TV Globo reexibe hoje à noite o programa “Chico & Amigos”. No especial, Chico interpreta personagens que marcaram sua carreira. (Agências O Globo e Estado)
Carreira inclui programas no rádio e na TV, livros, música e filmes
Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho nasceu em 12 de abril de 1931, em Maranguape, no Ceará. De família rica, seu pai tinha cinco filhos: Elano, Lupe, Lilia e Zelito, além do próprio Chico. Um incêndio mudou o destino da família, que perdeu todo o patrimônio. Aos oito anos, Chico se mudou com os parentes para o Rio.
A carreira começou na Rádio Guanabara. Tornou-se vascaíno, só para contrariar, porque o pai era botafoguense e eles moravam perto do Fluminense, o clube, onde fez amigos, cresceu e jogou bola à vontade. Até o dia em que, esperado para uma partida, foi em casa buscar o tênis e deu de cara com a irmã Lupi, que saía para fazer um teste na Rádio Guanabara. “Vou junto”, disse Chico. Aprovado nos testes para radioator e locutor, dizia sempre que tinha virado ator porque esquecera o tênis.
Com a fama no rádio, o humorista migrou para a TV e passou mais de 30 anos na Globo
Na TV, comandou programas como o “Chico City” e “Chico Total”
Àquela altura, Chico já havia vencido vários concursos de calouros graças ao talento de imitar vozes famosas, entre locutores e artistas. Passou ainda pela Rádio Mayrink Veiga. Ao mesmo tempo atuou em atrações estreladas por Haroldo Barbosa, Antônio Maria e Sérgio Porto, entre outros. Com a fama no rádio, nada mais natural do que migrar para a TV, onde atuou em programas de humor como “Noites Cariocas”, “O Riso é o Limite” e “Praça da Alegria”.
O diretor Carlos Manga, para quem Chico Anysio já havia escrito 18 chanchadas da Atlântida, aproveitou o surgimento do videotaipe e propôs ao humorista gravar um programa com seus personagens. Surgia aí o “Chico Anysio Show”. Na TV, Chico Anysio passou também pela TV Excelsior e Record, como uma das estrelas dos programas “Essa Noite se Improvisa” e “Vamos Simbora”, com Wilson Simonal.
Chico também escreveu livros, era pintor e compôs várias músicas, muitas delas registradas por Dolores Duran. Com Arnaud Rodrigues, formou a dupla Baianos e Novos Caetanos, e gravou um disco. O humorista estava na TV Globo há mais de 30 anos, onde comandou “Chico City”, “Chico Anysio Show”, “Chico Total”, “O Belo e as Feras” e “A Escolinha do Professor Raimundo”. Como ator, fez participações especiais na minissérie “Engraçadinha” e no filme “Tieta”. Entre as novelas em que atuou na TV Globo estão “Feijão Maravilha” (1979), “Terra Nostra” (1999), “Sinhá Moça” (2006), “Pé na Jaca” (2006), e “Caminho das Índias” (2009).
Em dezembro de 2009, a direção da Globo se rendeu ao mestre e lhe abriu uma vaga no calendário de especiais de fim de ano com o “Chico & Amigos”, que será reexibido hoje à noite. Por cerca de uma hora, personagens das mais diversas etnias, estirpes e épocas se encontraram, todos na pele de Chico. O especial fez eco e a Globo resolveu resgatar Chico para o “Zorra Total”. (Agências O Globo e Estado)
Personagens memoráveis
Professor Raimundo
O personagem, conhecido pelo gesto que acompanhava o bordão “E o salário, ó...”, foi criado em 1950, quando Chico trabalhava na rádio Mayrink Veiga. Muito imitada, “A Escolinha do Professor Raimundo” foi quadro de diversos programas humorísticos até 1990, quando ganhou seu próprio programa na Globo.
Pantaleão
Com um visual inspirado no imperador Dom Pedro II, usando óculos com uma das lentes escuras, é um aposentado que vive em sua cadeira de balanço, na companhia de Dona Terta, sua esposa, e Pedro Bó, menino que decidiu criar. Adora contar “causos” – todos ocorridos em 1927. Ficou marcado pelo bordão “É mentira, Terta?”
Azambuja
Típico malandro carioca, já foi jogador do time de Bonsucesso e arriscou-se por um tempo como cantor. Eterno desempregado, vive de aplicar pequenos golpes.
Popó
Museólogo aposentado, Apolônio Pandolé nasceu no dia 29 de fevereiro e só faz aniversário de quatro em quatro anos. Ele diz ter vivido com pessoas que nasceram há mais de 300 anos. Ninguém acredita, mas a verdade é que, apesar de afirmar ter 91 anos, Popó tem 364. Vive brigando com seu amigo Alpamerindo, a quem sempre diz “Você é idiota! Você é idiota!”.
Tim Tones
Sátira aos pastores evangélicos cujo único interesse é arrecadar ofertas, o nome do personagem faz referência a Jim Jones, fanático religioso norte-americano que organizou um suicídio em massa. Tim Tones enriqueceu com sua família por meio de uma falsa seita criada por ele, cujo bordão mais marcante é “Podem correr a sacolinha”. Mais atual impossível.
Haroldo
Ex-personal trainer homossexual, ele tenta de toda forma passar a imagem de heterossexual e atrair mulheres, mas é sempre lembrado pelo amigo Leon de seu codinome do passado: Luana.
Justo Veríssimo
O deputado federal pernambucano é um político corrupto que só pensa em se arrumar e odeio pessoas de classe social mais baixa. Ficou conhecido pelos bordões “Tenho horror a pobre!” e “Quero que pobre se exploda!”.
Bozó
Sérgio Dias Magalhães Marinho, nome completo do personagem, dizia trabalhar na Rede Globo para se dar bem.
Bento Carneiro
Valdevino Bento Carneiro é um vampiro brasileiro que se apresenta como “aquele que vem do aquém do além, adonde véve os mortos”. Com um sotaque caipira, sempre acompanhado de seu assistente Calunga (interpretado por Lug de Paula, filho de Chico), nunca consegue assustar ninguém. Ao contrário: é um vampiro medroso. Sua frase célebre é “Minha vingança sará maligrina”.
Salomé
Idosa gaúcha , foi professora do presidente Figueiredo e sentia-se no direito de ligar para ele, a quem chamava de guri, para fazer sérias cobranças. Seu bordão era “Eu faço a cabeça do João Batista ou não me chamo Salomé”, brincando com o nome dos personagens bíblicos.
Fonte: agazetaonline.
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