sexta-feira, 2 de abril de 2010

Ausência

Vinícius de Morais

Eu deixarei que morra em mim
o desejo de amor os teus olhos que são doces.
Porque nada te poderia dar senão a mágoa
de me veres eternamente exausto.

No entanto a tua presença
é qualquer coisa como a luz e a vida.
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto
e em minha voz a tua voz.

Não te quero ter porque em meu ser
tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados.
Para que eu possa levar uma gota de orvalho
nesta terra amaldiçoada. Que ficou sobre a minha carne
como uma nódoa do passado.

Eu deixarei... tu irás e encostarás tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos
e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu,
porque eu fui o grande íntimo da noite.

Porque eu encostei minha face na face da noite
e ouvia tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa
suspensas no espaço. E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.

Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos.
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir. E todas as lamentações do mar, do vento, do céu,
das aves, das estrelas. Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

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