terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

O limite da solidariedade

Rubens Menezes de Santana

E a inadiável esticada de sexta-feira, após o expediente prolongou-se além do costume, de forma que a confraria foi, de casa em casa, entregando cada um de seus membros.

No início da rua Dr. Batista de Morais, numa casa que fora de Rosa Hadad, morava o Joroca, por isso, foi um dos primeiros a retornar ao lar, doce lar, bem prá lá de “chumbado”.

Despediu-se de todos, abriu o portão e encaminhou-se à porta de entrada de “sua humilde residência”.

A confraria não arredou pé e solidária, atestava que o retardatário estava em boa companhia. Mas sua feição mais sacana aguardava mesmo era a justificativa que o gozador Joroca apresentaria à esposa.

Um cambaleante,carinhoso e discreto Joroca, bateu levemente à porta e chamou:

- Elícia. Já cheguei. Abra a porta, meu amor.

Após várias tentativas, a porta permanecia fechada e no interior da casa o mais absoluto silêncio.

A solidariedade inicial já descambava para gozação, ainda na fase dos cochichos.

Joroca percebeu e cheio de brios, apelou.

- É mesmo uma porra! Será possível que eu não mando mais na minha casa?! Eu sou um homem; ou um rato?! Pois eu vou botar a porta abaixo!

Recuou um pouco na comprida varanda e investiu, da maneira possível, contra a pacata e inocente porta.

Além destas qualidades, a tal porta também apresentava outras não menos nobres: 3 metros de altura, folhas duplas e maciça madeira de lei.

“- Do tempo do império!” Diria o Boá.

Como não estava travada por ferrolhos na parte inferior, a porta recebeu e assimilou o impacto, até atingir seu ponto máximo de resiliência e dar o troco. Daí em diante o que se viu foi o Joroca a fazer o caminho inverso: tropeça aqui, desequilibra ali, até estatelar-se de costas no meio da varanda. A volta foi mais rápida que a ida.

Quando ele conseguiu sentar-se, a confraria já estava às gargalhadas, sem mais se importar com o adiantado da hora, com o parceiro ou se seriam ouvidos.

- Ele vai tentar novamente! Dizia um.

- O cara é macho! Incentivava outro.

- Esta porta é agressiva...

- ...E reacionária!

- Ele não vai conseguir levantar-se. Provocava mais outro.

- Joroca? Vai dormir mesmo na varanda? Tem um tijolo aqui...pode servir de travesseiro.

-“ Alá”, a casinha do cachorro...

- Dê corda, não...

- ...É mesmo... este cachorro odeia ratos!

Rubens Menezes de Santana, o Rubinho, é ex-goleiro, professor aposentado e espécie de enciclopédia de histórias xapuriense.

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