Lula criou polêmica ao criticar os bagres do rio. Agora, se fundamenta em estudos de especialistas que opinam sobre a construção das usinas que produzirão 6,45 mil megawatts de energia. "Canais para transposição dos peixes manterão as condições de reprodução das diferentes espécies encontradas no rio", ele garante.
Embora afirme que as delegacias da Polícia Federal, especializadas em meio ambiente têm contribuído de forma positiva para o combate à biopirataria no Brasil, Lula admite que muito ainda pode e deve ser feito contra esse crime.
O presidente disse que projetos agrícolas na Amazônia terão que respeitar não só o zoneamento agroecológico como o caráter local. E não manifesta temor com a expansão da cultura da cana-de-açúcar para a fabricação de etanol. "Há mais de uma década, pelo menos, quatro usinas de cana já operam nos arredores de Manaus, no Amapá e no Pará", afirmou. A seguir, os principais trechos da entrevista, na qual Lula aborda exclusivamente temas amazônicos:
O senhor acompanhou a luta dos sindicalistas Wilson Pinheiro e Chico Mendes. Entende que a luta sindical na Amazônia avançou ou estagnou?
Avançou. A luta avançou em vários sentidos e em uma direção. Em vários sentidos do ponto de vista político, social, moral e ético. Isso porque, naquela época, era uma luta isolada de um grupo de pessoas, apoiada por alguns aliados no Congresso Nacional, por alguns jornalistas, alguns pesquisadores e, principalmente, pelas comunidades locais, mais especificamente a de Xapuri. Se formos fazer uma retrospectiva de 20 anos atrás, quando aconteceu o primeiro encontro para a criação da Aliança dos Povos das Florestas, vamos ver que tinham acabado de assassinar o Chico Mendes, em função da luta que ele fazia.
Hoje, passados 20 anos, os índios estão reconquistando o direito sobre suas terras ocupadas, e foi criada uma nova modalidade de unidade de conservação, que viabilizou as reservas extrativistas. Estas comunidades vêm inscrevendo na história deste País o direito de ter expressas suas idéias, seus rostos, sua cultura e continuam lutando para ampliar seus direitos e conquistas. Então, não tenho dúvidas de que avançou e avançou a tal ponto que naquela época não existia um governo estadual com qualquer compromisso com estas comunidades. Hoje, você encontra uma Ana Júlia no Pará, um Binho no Acre, um Eduardo Braga, no Amazonas e um Valdez no Amapá, por exemplo. As hidrelétricas do Rio Madeira estão entre as principais prioridades do PAC.
Que garantia o seu governo oferece no sentido de que elas serão usinas diferentes e que causarão menos agressões ambientais?
A licença prévia ambiental, emitida pelo Ibama, é a principal garantia de que todas as exigências serão cumpridas com base na legislação ambiental brasileira, que é considerada uma das mais completas do mundo. Os projetos do Rio Madeira seguiram critérios rígidos de redução de impacto, no sentido de impedir o alagamento de áreas de floresta, o acúmulo de sedimentos ou o desequilíbrio na população de peixes. Os projetos prevêem, por exemplo, um tipo de barragem que não cria grandes lagos. E, no caso das duas usinas, os estudos vão garantir que a área alagada seja praticamente igual à área atualmente coberta pelo rio no período de cheia.
Outra medida prevista é a construção de canais para transposição dos peixes, mantendo as condições de reprodução das diferentes espécies encontradas no rio. Essa certeza de que o impacto será mínimo também está sustentada no resultado dos estudos de especialistas brasileiros e estrangeiros em impactos de grandes usinas, a pedido do Ministério de Minas e Energia.
Capixaba, no Acre, possui uma usina de etanol. Proprietários da região vêm alugando áreas de pastagens para o plantio de cana-de-açúcar. O Acre será exceção nesse cultivo na Amazônia?
A política básica é a seguinte: o governo não autoriza a derrubada de uma única árvore da floresta amazônica para plantar cana. O que é preciso levar em conta é que, quando se fala em Amazônia, muitas vezes se está se referindo à chamada Amazônia Legal – que inclui estados inteiros como Tocantins e Mato Grosso, além de parte do Maranhão, por exemplo. Outra coisa: há mais de uma década, pelo menos, quatro usinas de cana já operam nos arredores de Manaus, no Amapá e no Pará. Como lidar, então, com uma situação tão complexa? Definindo cada área com clareza, para que a floresta seja efetivamente protegida. É por isso que vamos concluir, até junho do próximo ano, o zoneamento agroecológico da cana -de-açúcar para todo o Brasil, onde já decidimos que não será incluído o bioma Amazônia.
O governo também está construindo instrumentos para orientar que a expansão da cana se dê preferencialmente em áreas degradadas. Com a regulação adequada e uma fiscalização eficiente, é perfeitamente possível encontrar o modelo econômica e ecologicamente sustentável que o Brasil tanto deseja. No caso específico da sua pergunta, existe um projeto para aproveitar uma antiga instalação já existente e, assim, gerar novas atividades. Mas acreditamos que é um caso pontual e qualquer projeto que surgir na região amazônica terá que respeitar não só o zoneamento agroecológico como o caráter local.
A Amazônia é alvo da cobiça internacional por conta de suas riquezas. Biopiratas vendem sangue de índio pela internet, rãs, pássaros e os dematamentos ainda atingem índices críticos. O que o governo fez e fará para coibir essas práticas nefastas?
O desmatamento da Amazônia vem caindo de forma sistemática nos últimos anos e agora, em 2007, a projeção é de que cairá ainda mais. Juntos, governo e sociedade, conseguimos reduzir em 50% o desmatamento na Amazônia nos últimos dois anos. Na Mata Atlântica, as reduções foram de 75%. Isso equivale a evitar o lançamento, na atmosfera, de 430 milhões de toneladas de gás carbônico. Homologamos mais de 10 milhões de hectares de terras indígenas. Nossos esforços também nos permitiram dobrar a área destinada a reservas extrativistas no Brasil: se compararmos com dados de 2002, criamos mais 21 novas reservas, num total de 10 milhões e 100 mil hectares que beneficiam mais de 20 mil famílias. Portanto, há um esforço integrado de Governo para enfrentar a situação do desmatamento e com resultados muito positivos.
Com relação à biopirataria implementamos, a partir de 2003, o Conselho de Patrimônio Genético, que definiu, por meio de decretos e toda legislação envolvendo resoluções e atos do Executivo, um conjunto de medidas de punição para ações de extração ilegal de recursos da natureza, da biodiversidade. Temos hoje funcionando um cadastro nacional, que envolve as pesquisas e coleta de animais para pesquisa e um sistema de licenciamento e autorização para acesso ao patrimônio genético – que orienta as pesquisas de forma a atuarem com respeito à legislação ambiental e observando a obrigatoriedade de repartição de benefícios, conforme exige a Convenção Internacional sobre Diversidade Biológica. Temos ainda, desde 2003, a implantação de delegacias da Polícia Federal, especializadas em meio ambiente, que têm contribuído de forma positiva para o combate à biopirataria no Brasil. Muito ainda pode e deve ser feito. Mas precisamos valorizar nossas vitórias, que foram muitas e relevantes.
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