terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

BAFÔMETRO NO CARNAVAL?

João Baptista Herkenhoff

Ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo. O argumento contra a obrigatoriedade do bafômetro procede.

Entretanto, a recusa de submissão ao procedimento deverá ser ponderada, em desfavor do motorista, se ocorre um acidente.

Quando alguém, que não ingeriu bebida alcoólica, vê-se envolvido num desastre, a melhor conduta será aceitar o teste: a verificação negativa da presença de álcool no organismo será elemento importante em seu benefício.

A “lei seca”, se aplicada com sabedoria, merece aplausos. Entretanto, a virtude está no meio: “in medio virtus”.

Durante o Carnaval será sábio adotar, rigidamente, a política do “álcool zero”? Não permitir ao folião nem mesmo uma cerveja ou um pequeno gole de cachaça?

O Brasil está em clima de Carnaval.  O Carnaval não é, de forma algum, um assunto fútil. Muito pelo contrário, é coisa muito séria.

A busca de identidade é muito forte na alma humana. Alguns afirmam sua identidade praticando crimes. Só a prática de atos criminosos lhes conferem presença no mundo. No submundo do crime têm nome e são ouvidos. A autoafirmação pela rota do crime é prejudicial à coletividade, porém compensadora para a pessoa que tenta fugir do anonimato através desta solução.

Muito mais sábio é buscar ser pessoa através da participação numa escola de samba ou bloco de Carnaval. Quem pertence a uma escola ou bloco tem endereço, raiz, deixa de ser alguém sem lenço e sem documento. As escolas de samba permitem que os mais pobres, pelo menos por um dia, sejam aplaudidos nas avenidas e reconhecidos como gente.

Aquele gari que nunca ouviu um “muito obrigado”, pelo seu importante trabalho de limpeza das vias públicas, é aplaudido com entusiasmo quando desfila fantasiado de príncipe, marinheiro ou aviador.

O desfile de uma escola de samba é o teatro do povo, e o teatro, por uma longa tradição, construiu consciências. Não é por acaso que temas de escolas de samba foram vetados nas ditaduras brasileiras. Hoje vivemos num clima democrático. As escolas de samba ou blocos carnavalescos podem satirizar a presidente da República, governadores de Estados, legisladores, magistrados e até o Prefeito que paga pelo Carnaval. Apesar de todas as dificuldades enfrentadas pelo povo, que tesouro sem preço é a Liberdade!

Os que zelam pelo trânsito não devem ser prepotentes, como não deve ser prepotente quem quer que tenha, nesta ou naquela função, alguma parcela de autoridade.

Uma política de segurança no trânsito não se limita à utilização do bafômetro, como forma de coibir a embriaguez. Todo um trabalho educativo há de ser realizado para inspirar na coletividade, principalmente nos jovens, atitudes de respeito ao próximo, responsabilidade, moderação, convívio fraterno.

João Baptista Herkenhoff é juiz de Direito aposentado (ES), professor e escritor.

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