sexta-feira, 17 de julho de 2020

Hipocrisia pandêmica e o “novo normal”

Entre os muitos impactos causados pelo novo coronavírus, certamente devem ser considerados os danos à saúde física e mental, favorecidos pelos meses seguidos de isolamento social – para quem a ele de fato se submeteu.

É exatamente na aceitação desse fato que reside a mais recente controvérsia da vida social e política de Xapuri: a autorização para o funcionamento de igrejas e academias de ginástica dada pela prefeitura em meio à pandemia.

Os cultos religiosos e a prática de exercícios físicos são considerados pela população como fundamentais para a manutenção da saúde do corpo e do espírito. Para muitos, ir à igreja previne os males da alma, assim como ir academia fortalece os músculos e a mente.

O prefeito Ubiracy Vasconcelos começou suspendendo a proibição do funcionamento de igrejas, recomendando a não realização de cultos, ou seja, transferiu para os líderes religiosos a decisão de realizá-los ou não, estabelecendo rígidas exigências para o caso de reaberturas dos templos.

O mesmo ocorreu, pouco tempo depois, com as escassas academias da cidade, que foram autorizadas a funcionar também sob severos critérios de prevenção e higiene, entre os quais a presença de apenas quatro alunos por horário.

A mistura de tudo isso resultou em confusão e aborrecimentos para o chefe do executivo municipal. Críticos das redes sociais atribuíram às medidas um repentino aumento de casos positivos do coronavírus no município.

O assunto se transformou em recomendação do Ministério Público para que, não apenas Xapuri, mas todos os municípios do estado obedeçam integralmente ao plano de retomada de atividades do governo batizado de Pacto Acre sem Covid.

Apesar dos apelos da população e da convicção da equipe de enfrentamento à pandemia no município de que as igrejas e academias não contribuem para a disseminação da covid-19, os espaços serão novamente impedidos de funcionar a partir desta sexta-feira.

Tão certo como o fato de que igreja e academia são coisas positivas para o povo angustiado pela excepcionalidade do tempo em que vivemos é que existe uma certa dose de hipocrisia e oportunismo da parte de quem atira sobre essas duas atividades a responsabilidade sobre o risco de agravamento da pandemia.

Em Xapuri, como em outros lugares, já faz tempo que não existe o respeito ao chamado isolamento social. As pessoas subestimam o vírus a toda hora e promovem aglomerações constantes nos mais diversos eventos, seja nos famosos piseiros, reuniões políticas e até em inauguração de mercado, bastando que role uma boca livre.

O problema do coronavírus, provavelmente, não será resolvido até a chegada de uma vacina, o que nos forçará a compreender que teremos que aprender a conviver com o risco. Se é possível que o próprio mundo jamais volte a ser o mesmo porque então não aproveitar o ensejo e mudarmos antecipadamente de atitude com vistas ao novo tempo que se aproxima?

No mundo pós-pandemia, precisaremos mais do que nunca de demonstrações de solidariedade e cooperação diante da necessidade de enfrentar de maneira responsável um inimigo comum, que talvez jamais seja vencido. O “novo normal” poderá até ser construído por alguns, mas deverá, obrigatoriamente, ser abraçado por todos.

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