Não há nada de novo no texto que vou escrever a seguir.
As denúncias de irregularidades no Instituto Chico Mendes, feitas por Deusamar Mendes e levadas a público em primeira mão por este blog, representam apenas mais uma amostra de como os empreendimentos ancorados nos ideais do líder sindical não souberam ser levados a efeito - por incompetência ou por má fé - por aqueles que, legitimamente ou não, se apossaram de sua herança.
A Reserva Extrativista Chico Mendes, criada logo após a morte do seringueiro para garantir a conservação da floresta em harmonia com atividades econômicas sustentáveis, que garantissem a sobrevivência digna dos seus habitantes, até hoje não fez uma coisa nem outra. O extrativista continua vivendo mal, apesar da chegada de benefícios como energia elétrica e ramais, e a área foi aos poucos se transfomando em pastagem para gado.
Quando morreu, Chico Mendes deixou fundada a Cooperativa Agroextrativista de Xapuri, organização que eliminava a indesejável figura do atravessador do processo de produção e comercialização dos produtos extrativistas. Considerada como a redenção econômica dos seringueiros-sócios, a CAEX passou a ser administrada por pessoas que nada entendiam de cooperativismo e o resultado disso somado a ganância e a má fé de alguns foi a quase falência da cooperativa, que hoje estrebucha sem que saiba o que foi feito com R$ 1 milhão da Conab - Companhia Nacional de Abastecimento - repassados para a compra antecipada da castanha no ano de 2006.
Outro exemplo é o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri, certamente o maior símbolo da luta de Chico Mendes e da resistência dos trabalhadores contra as derrubadas nas décadas de 1970 e 1980. Nos últimos 10 ou 15 anos a entidade mergulhou em um poço escuro do qual a atual direção tenta sair na atualidade. No último processo de escolha da presidência do sindicato, uma verdadeira guerra entre antigos militantes do movimento em Xapuri deixou claro que os interesses em torno da entidade que se tornou mero cartório são puramente político-eleitorais.
Por fim, o próprio Instituto que leva o nome de Chico Mendes, que de organização cujos objetivos são preservar a memória do herói e desenvolver projetos e programas de cunho educacional e ambiental, se tornou numa caixa de pandora aberta recentemente com as denúncias feito ao Ministério Público. Vale lembrar que a Fundação Centro de Memória Chico Mendes, criada após a morte do seringueiro, atolada em dívidas fiscais e trabalhistas, já não funcionava de fato, servindo a sua estrutura física ao ICM.
A leitora Lucimar, seringueira e sócia fundadora da Fundação Centro de Memória Chico Mendes, faz o seguinte comentário:
- Conheci o sindicalista em 1979, cortanto seringa na colocação do meu pai, portanto tive a oportunidade de conhecer de perto a pessoa humilde e trabalhadora que ele foi. Depois da sua morte, criamos a Fundação Chico Mendes na intenção de beneficiar os SERINGUEIROS, no entanto, não é o que vejo hoje, os seringueiros nem sequer são beneficiados por essa instituição. Hoje, trabalho na fábrica de preservativos de Xapuri e fico feliz em ver um pouquinho do sonho de Chico Mendes ser realizado, que era ajudar verdadeiramente a vida dos seringueiros.
Na foto que ilustra a postagem, o busto em bronze de Chico Mendes, exposto no Parque do Ibirapuera, em São Paulo. (Foto: ARTExplorer/Flickr).
Chico Mendes sonhou com uma vida melhor para os seringueiros e anunciou sua própria morte, depois de colocar em xeque o império da pistolagem em Xapuri, feito que beneficiou a todos, mas certamente não sabia que os caminhos que seriam trilhados pelos herdeiros de sua luta fariam parada em pontos tão constrangedores e contrários à sua história na defesa dos trabalhadores da floresta.
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