A Continuidade nos Estados
De Marcos Coimbra, sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi:
Como nossa experiência com eleições presidenciais no Brasil contemporâneo é pequena, é sempre ilustrativo olhar em torno, procurando identificar, em outros aspectos de nossa cultura política, elementos que nos ajudem a entendê-las. Por exemplo, nas eleições para os governos estaduais.
Já fizemos mais de 150 eleições para o cargo de governador desde 1982, quando, depois do intervalo imposto pela ditadura em 1965, recuperamos o direito de realizá-las. A lógica que as preside, o modo como os eleitores pensam e participam delas é diferente do que acontece no plano nacional. Ainda assim, há o que aprender com elas.
Tomemos uma questão central nas eleições presidenciais de 2010, a escolha entre continuidade e mudança. Lula, desde quando começou a imaginar como vencê-las, investiu sua liderança e agiu para fazer com que fosse essa a disjuntiva apresentada aos eleitores. Suas primeiríssimas manifestações sobre a sucessão foram de que a sociedade brasileira teria que se pronunciar sobre os anos do governo do PSDB vis-à-vis aos do PT. Seria o plebiscito entre ele e Fernando Henrique, a respeito do qual tanto se falou. Continuar era manter o que se tinha, mudar voltar ao passado.
No plano federal, a proposta de Lula pareceu estranha a muitos. Nossas cinco eleições presidenciais não envolveram escolhas parecidas. Mas ela tem semelhanças com dezenas de eleições estaduais nos últimos anos. Na hora de escolher governadores, é muito comum que o processo envolva opções como a que ele quer que façamos agora: continuar ou mudar.
Pensemos nas eleições para governador este ano. Se olharmos as pesquisas disponíveis para os 27 estados, vemos que praticamente todos os governadores que terminam agora um primeiro mandato são candidatos à renovação. Todos estão bem colocados, sendo alguns favoritos absolutos (como Eduardo Campos e Cid Gomes), outros liderando com vantagem (como Sérgio Cabral e Jaques Wagner) e os demais competitivos. A única exceção é a governadora do Rio Grande do Sul, mal colocada em um distante terceiro lugar dos favoritos.
Há dois governadores que poderiam, mas não vão disputar. São Binho Marques, do Acre, e Alcides Rodrigues, de Goiás. Ambos são ex-vice-governadores que se elegeram graças ao prestígio de seus patronos políticos, que agora retornam. São casos que se poderiam encaixar na imagem de “terceiros mandatos”. Não podendo disputar, Marconi Perillo fez de seu vice o sucessor, como fez Jorge Viana, no Acre, com Binho. Nos dois estados, os eleitores referendaram a indicação. Agora, os chefes são favoritos para voltar (no Acre, por interposta pessoa, o irmão de Jorge, senador Tião Viana).
O fenômeno de vices que assumem e disputam um mandato com cara de continuidade nunca foi tão frequente quanto neste ano. Ele está presente no Amapá e no Amazonas, em Mato Grosso e Minas Gerais, no Paraná, Piauí e no Rio Grande do Norte, em Rondônia e em Santa Catarina. Se somarmos os governadores eleitos em 2006, esses vices e os casos do Acre e de Goiás, temos candidaturas de estrita continuidade em 23 estados. Quase todos podem ganhar, alguns com mais, outros com menos chances.
Nos 4 que restam, temos São Paulo, onde um vice assumiu sem aspirar a permanecer, e Alckmin lidera, abrindo a possibilidade de um quinto governo peessedebista em sequência. Temos o Espírito Santo, onde o governador resolveu permanecer no cargo para orquestrar sua sucessão, algo que parece que conseguirá. O último estado é Tocantins, que tem hoje um governador eleito por voto indireto e que pretende se manter no cargo pelo voto popular. E o Distrito Federal, o único lugar em que ninguém fala em continuidade, mas que pode eleger o criador de tudo que os seguintes fizeram.
Se quiséssemos eleições para governador mais marcadas pela continuidade, seria difícil encontrar. O que isso sugere para as eleições presidenciais é fácil imaginar.
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