Dia de recordação dos entes queridos que já partiram para outro plano, o feriado de Finados também mostra que, além de lembrança e saudade, a morte pode significar esquecimento de muitos daqueles que já cumpriram com suas missões neste mundo.
Cemitérios sempre despertaram em mim um sentimento misto de medo e curiosidade. Entrar em um deles remete-me, inevitavelmente, ao pensamento que procuramos manter afastado do rol de nossas principais preocupações em vida. Salutarmente, evitamos pensar na morte mesmo sabendo ser ela a única certeza de nossa existência. Por outro lado, as necrópoles também me despertam o interesse pelas muitas histórias de vidas encerradas em seus túmulos frios e silenciosos. Como e quando viveram, como morreram e o que fizeram por este mundo em que continuamos a dar sequência à vida até que seja chegada a nossa vez.
Essa curiosidade me faz perambular quase que todos os anos por entre as antigas catacumbas e os modernos jazigos construídos pelas famílias mais abastadas financeiramente. É curioso que mesmo após a morte, destino comum a todos os viventes, as pessoas continuam a ser distinguidas pela condição social e econômica. Simples sepulturas, muitas vezes providas apenas de mera cruz de madeira, dividem o espaço com túmulos bem ornados e capelas recobertas de caríssimas peças de mármore e belos epitáfios que denunciam a notoriedade de uns e o anonimato de outros.
Outra realidade que se nota ao visitar o cemitério São José, em Xapuri, é o abandono de vários túmulos, muitos dos quais, de tão antigos, já se encontram quase que completamente destruídos pela ação do tempo. Impossível saber ao certo a razão desse triste abandono que fatalmente culminará com o total desaparecimento daquilo que certamente representa o último vestígio material da existência e da passagem de um ser humano pela vida. Famílias que deixaram a cidade para viver em locais distantes ou pessoas que vieram de outros lugares para cá e que, ao morrer, não deixarem quem zelasse de sua última morada são algumas das circunstâncias que imagino explicar o esquecimento.
Entre esses túmulos antigos e abandonados do cemitério de Xapuri, localizei há alguns anos o que resta do mausoléu (fotos acima) de um personagem ilustre da história da cidade. Trata-se do professor cearense Anthero Soares Bezerra, que relevantes serviços prestou à nossa educação nos séculos XIX e XX, motivo pelo qual dá nome a uma das principais escolas da rede estadual de ensino no município. O educador nasceu no distante ano de 1855 e faleceu em 1927, em um dia 25 de dezembro. Voltei ao túmulo do professor neste dia de Finados e constatei que a velha estrutura começa a tombar para um lado ameaçando ruir.
Certa vez, sugeri a um vereador conhecido meu que indicasse ao município a recuperação do mausoléu do professor Anthero Soares Bezerra. Seria o mínimo que se poderia fazer pela memória - quase que perdida - de uma pessoa que, além de haver contribuído sobremaneira com os esforços de progresso e desenvolvimento da cidade, nos honrou em entregar seus restos mortais a esta terra que certamente adotou como sua. Minha sugestão, é claro, não foi ouvida e o tal vereador foi merecidamente sepultado politicamente nas últimas eleições municipais. Penso em voltar a sugerir a providência ao poder público. A morte deve ser razão para saudade e lembrança; jamais para o abandono.
Nas fotos acima, outros exemplos de túmulos abandonados no cemitério São José, de Xapuri. Um deles serve de canteiro a uma espécie de arbusto que já toma dimensão de árvore frondosa.
Cliquem nas fotos para ampliá-las.
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