José Augusto Fontes
O mote do seringueiro é a esperança de semear a vida
É um bom sentido do viver na soberana moldura verde
O látex da questão ideal não é ser contra isso ou aquilo
Mas a favor de respirar profundo, de um cultivar perene
Nada fácil nem dócil, o prazer da conquista está na luta
Tudo simples, como o amor à sombra de uma samaúma
Como percorrer um varadouro, todo dia a labuta solene
Na ferida cortada, a semente do Chico reproduz a verve
Mateiro, castanheiro, velho e rapaz, poesia de todo estilo
Passou a ver a floresta, a entender o gene, sentir a bruma
Abraçou a causa, a mensagem; proseia e saboreia a fruta
O rio da vida prossegue, e o mote do seringueiro o imita
Faz que passa, e permanece aqui, ali, remanso e espuma
O balseiro não segura a onda, um rio rega, nada se perde
Gente do mato, bichos da lua, um sol plantado na aldeia
A floresta semeia, o sonho corre pelas veias, e ressuscita
Os olhos do mundo se abrem para um grito, para a idéia
A seiva corre matas e águas, espreme os ventos, acredita
Desperta a flor dos sentimentos, é encanto, é força e filho
Multiplicação. Vai passando da vida, vai vencer o porvir
A História, o tempo, a escolha simples é gesto de empate
Jeito de viver, de seguir, a bubuia, um deixar fluir, aquiri
Renasceu, colhe-se acalanto, o canto ecoou sem desmate
Nada dissolve a marcha, o tiro lancinante gerou estribilho
A mata recebeu cada lágrima, floresceu e propagou a vida
O sonho navega nos estirões, viaja pelos olhos, vive aqui
Se estica nas altas castanheiras, lança certeza e desnorteia
Toda emoção escorre devagar, feito látex nas seringueiras
Toda borracha tenra pode endurecer, sangrar, gerar, parir
Doce rapadura, mel de dureza, gente sofrida, olho risonho
Gente boa de beiras de rio, de aliança, de alegrias faceiras
Orgulhosa da simplicidade, do compromisso tão fascinante
O mote do seringueiro é a esperança, na beira de um sonho.
◙ O acreano José Augusto Fontes é poeta, cronista e juiz de direito. O poema foi postado ontem, quinta-feira, no blog do jornalista Altino Machado.
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