O mito da cabeça de burro

Não há vivente por essas bandas que nunca tenha ouvido alguém afirmar que em Xapuri existe uma cabeça de burro enterrada em algum lugar. A expressão se assemelha a outra, que diz que a cidade anda em marcha à ré. Ambas, de tão antigas, viraram folclore, e são empregadas sempre que alguém quer protestar contra o fato de que a cidade natal de figuras como Armando Nogueira, Adib Jatene e Chico Mendes não evolui, não progride.

É quase unânime o pensamento de que pela importância midiática que possui, primeiramente pelo caráter histórico, por ser considerada o berço da revolução armada que foi o pontapé para o Acre se tornar brasileiro, e depois por ter sido o cenário de uma outra revolução, essa pacífica, que tornou mundialmente conhecida a luta dos povos da floresta, Xapuri deveria ser hoje o melhor lugar da Amazônia para se viver.

Mas é fato que depois de todas as revoluções possíveis ocorridas por aqui, Xapuri realmente não conseguiu sair do lugar. Fato contra o qual existem muitos argumentos, mas nenhum que possa convencer aquilo que a pretexto de defender o indefensável convencionou-se chamar por aqui pejorativamente de senso comum: a opinião do povão, o pensamento daqueles que sentem na pele e na vida as agruras da dura realidade.  

E a culpa por Xapuri não sair do buraco negro em que se encontra há décadas certamente não cabe ao mito da cabeça de burro e muito menos ao suposto hábito da cidade de caminhar para trás. Uma das muitas explicações está ilustrada pela imagem acima, da rua Deocleciano Lago, que segundo informa o blog Xapuri em Destaque, que divulga as ações da prefeitura de Xapuri, deveria estar completamente pavimentada.

O blog informa que agentes da Polícia Federal vistoriaram esta semana convênios para pavimentação de ruas que efetivamente não foram executados durante o mandato do ex-prefeito Wanderley Viana, cuja gestão não difere de outras quanto a ocorrências desse tipo. Coisas dessa natureza sempre aconteceram. Antes, durante e depois da  passagem de Viana pela prefeitura de Xapuri e exemplos não faltam.

Um fato bem recente caiu nas mãos do Ministério Público Estadual, os setecentos e poucos metros de ruas que deveriam ser asfaltadas no bairro Sibéria. Não faltaram avisos de que funcionários da empresa responsável pelos serviços vendiam abertamente o material da obra para proprietários de terras da região. Mas o que importava não era fiscalizar, denunciar ou cobrar. O importante era a obra pronta e entregue. E a população do bairro, extremamente carente, recebeu um serviço acanalhado.

Está claro então que as razões para Xapuri não sair do atraso não estão enterradas, mas sim sob a luz do sol. Está no lucro das empresas que não executam as obras conforme o script. Está no piche, na brita e no óleo diesel que são corriqueira e criminosamente desviados de obras que se fossem bem executadas minimizariam o sofrimento daqueles que dependem da assistência do poder público.

A responsabilidade por isso tudo está na falta de atitude do Poder Executivo e na ausência de compromisso do Legislativo com os interesses da massa. Lá sim, nessas esferas, deve haver muitas cabeças de burros, enterradas ou não, além de muita gente que se propusesse a andar para frente e a cuidar menos de si mesmos, com certeza Xapuri estaria vivendo momentos bem mais felizes que os dias atuais.